"Quando perdemos a capacidade de nos indignarmos com as atrocidades praticadas contra outros, perdemos também o direito de nos considerarmos seres humanos civilizados." ― Vladimir Herzog

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Painel Paulo Freire, obra de Luiz Carlos Cappellano.

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segunda-feira, 26 de julho de 2021

Destruir monumentos nunca foi um problema no Brasil

'O problema só ocorre quando se destroem os símbolos que glorificam a elite.'

Publicado originalmente no Facebook do Pensar a História
Destruir monumentos nunca foi um problema no Brasil. Basta que sejam os monumentos certos.

O Monumento Eldorado Memória, projetado por Oscar Niemeyer para homenagear os dezenove sem-terra mortos durante o Massacre de Eldorado do Carajás, foi destruído apenas duas semanas depois de sua inauguração. Nunca foi reerguido.

O Memorial 9 de Novembro, também de Oscar Niemeyer, construído em memória dos três trabalhadores da Companhia Siderúrgica Nacional mortos pelo Exército Brasileiro durante a Greve dos Operários de 1988, foi destruído no dia seguinte à sua inauguração.

O problema só ocorre quando se destroem os símbolos que glorificam a elite. A destruição dos raros monumentos erguidos em memória da classe trabalhadora nunca suscitou indignação ou falsos debates sobre "preservação da história".

sábado, 10 de julho de 2021

Baixem o tom, fardados!, por Cristina Serra

'Depois de tantos anos restritos aos quartéis e às suas atribuições profissionais, os militares voltaram ao poder de braços dados com um sujeito desqualificado, medíocre, notoriamente ligado a esquemas criminosos'

General da reserva Braga Netto, Ministro da Defesa

Generais, brigadeiros e almirantes deveriam ser os primeiros a querer esclarecer as gravíssimas denúncias de corrupção, reveladas pela CPI da Covid, que batem à porta de Bolsonaro e de uma penca de fardados. Mas o que estamos vendo é bem o contrário. 

Como em outros momentos da nossa história, a cúpula das Forças Armadas e o Ministério da Defesa preferem esconder a sujeira embaixo do tapete e peitar as instituições democráticas, afrontar a Constituição e a sociedade civil. É esse o sentido da nota assinada pelo ministro Braga Netto e pelos três comandantes militares após a declaração do presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), de que há um “lado podre das Forças Armadas envolvido com falcatrua dentro do governo”. 

Alguém duvida disso? A pior gestão da pandemia no mundo foi a de um militar brasileiro, o general da ativa Eduardo Pazuello. Agora, sabemos também que a alta hierarquia do ministério na gestão dele, toda fardada, aparece no ‘vacinagate’, notadamente seu ex-secretário-executivo, o coronel da reserva Élcio Franco. 

Depois de tantos anos restritos aos quartéis e às suas atribuições profissionais, os militares voltaram ao poder de braços dados com um sujeito desqualificado, medíocre, notoriamente ligado a esquemas criminosos, que vão de rachadinhas a milicianos, e que é sustentado no Congresso pelo Centrão.

Cúmplices e agentes ativos de tudo isso, os militares vêm cantar de galo, atribuindo-se o status de “fator essencial de estabilidade do país”. Ora, é exatamente o contrário. Senhores fardados, vocês deixarão uma herança de morte, doença, fome e corrupção. Querem enganar quem? Acham que estão em 1964? 

Baixem o tom, senhores. O Brasil não tem medo de suas carrancas, de seus coturnos e de seus tanques. Generais, vistam o pijama e, quando a pandemia passar, organizem um campeonato de gamão na orla de Copacabana. É o melhor que podem fazer pelo país.

(publicado originalmente na Folha de São Paulo em 10/07/2021)




Quem enlameou as Forças Armadas foram os militares que se uniram ao governo sujo de Jair, por Cynara Menezes

Defesa, que nada fez contra a militarização da Saúde, agora ameaça o país por não aceitar investigação de corrupção sobre os seus

Bolsonaro e militares na cerimônia de hasteamento da bandeira. (Foto: Alan Santos/PR)

Em setembro de 2020, após uma interinidade de quatro meses, o general da ativa Eduardo Pazuello foi efetivado pelo presidente Jair Bolsonaro como ministro da Saúde do Brasil, sem ter nenhuma relação com a área. Pazuello, por sua vez, nomearia outros 22 militares sem formação em saúde para auxiliá-lo na pasta. No governo como um todo, a presença de militares em cargos ocupados tradicionalmente por civis aumentou 33% desde que o capitão reformado chegou ao Planalto.

Toda essa verdeolivização da administração pública, inédita após a ditadura, era considerada normal pelo comando das Forças Armadas. Mas, agora que surgiram as primeiras denúncias de corrupção do governo Bolsonaro, envolvendo justamente o militarizado ministério da Saúde, os comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica, em vez de culparem a si mesmos por terem aderido à aventura bolsonarista, atacam o presidente da CPI da Covid, Omar Aziz, por supostamente macular a imagem das Forças.

Nesta quarta-feira, após Aziz dar voz de prisão ao ex-diretor do Ministério da Saúde Roberto Dias, ex-sargento da Aeronáutica, os comandantes das três Forças soltaram uma nota dura, não contra o militar acusado de corrupção, mas contra o presidente da CPI. “As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano”, diz o texto, em tom de ameaça ao país. Os militares alegam que Aziz foi “desrespeitoso”, quando na verdade o senador apelara aos “bons” integrantes das Força “envergonhados” com os malfeitos praticados na Saúde.
A nota da Defesa

“Os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados com algumas pessoas que hoje estão na mídia, porque fazia muito tempo, fazia muitos anos que o Brasil não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo, fazia muitos anos”, disse Aziz a Dias durante sua oitiva, livrando inclusive a cara dos ditadores Ernesto Geisel e João Baptista de Figueiredo da corrupção durante a ditadura, que nunca apareceu porque era encoberta pelos militares, mantida longe da opinião pública graças à censura.

“Figueiredo morreu pobre, Geisel morreu pobre, porque a gente conhecia e eu estava naquele momento contra eles, mas uma coisa que a gente não acusava era de corrupção deles”, disse o senador, que não “generalizou” coisa nenhuma. Citou nominalmente o general Pazuello, o coronel Élcio Franco –dois dos militares que foram colocados pelo bolsonarismo na Saúde e que estão no epicentro das denúncias de corrupção.

Ora, se os militares acham normal ocupar o lugar de civis, também devem achar normal serem investigados por corrupção que nem os civis. Ou se consideram acima da lei? A CPI investiga sérias denúncias de propina na compra de vacinas pelo ministério da Saúde, em meio a uma pandemia, quando a pasta estava sob o comando de um general. Se fosse um civil o ministro, seria investigado. Portanto, o general também deve ser. Se não quisesse se igualar aos civis, que recusasse o cargo.

Quem enlameou as Forças Armadas foram os militares que aceitaram se unir ao governo sujo de Jair. Não podem nem sequer alegar que não sabiam com quem estavam se juntando. Bolsonaro é velho conhecido das Forças Armadas, e de lá não saiu com nenhuma medalha no peito. Foi alvo de processo disciplinar, chegou a ser preso, e foi para a reserva após ser acusado de planejar atentados a bombas em quartéis. Ou seja, saiu do Exército pela porta dos fundos, sem nenhum mérito ou louvor.

Quem aceita se juntar a um militar desonrado, desonrado é.




segunda-feira, 5 de julho de 2021

“Conhecereis a verdade e a verdade o derrubará”, por Fernando Brito

Vai ser necessária uma adaptação do tão citado João, 8:23: é mais correto dizer que “Conhecereis a verdade e a verdade o derrubará”

Mais um áudio, além do que expõe a “Máfia da Vacina” que começou a ser conhecido ontem, bate fundo nos alicerces do Governo Bolsonaro.

Esta madrugada, no UOL, a repórter Juliana Dal Piva publica trechos de conversas da ex-cunhada de Jair Bolsonaro, Andréa Cristina Vale, de Fabrício Queiroz e de sua mulher, Márcia Aguiar que são, mesmo com todo o hábito que já criamos, de cair o queixo.

E que explicita que o esquema de “rachadinhas” não ficava restrito aos filhos, mas o próprio Jair, quando era deputado federal. André Siqueira Valle, funcionário do gabinete em Brasília, tinha de devolver R$ 6 mil reais para os bolsos do ex-capitão, mas entregava menos e, por isso, foi demitido.

Fabrício Queiroz se lamenta de alguém que não seguiu suas ordens sobre mensagens no celular – “apaga, apaga, apaga, apaga” – . diz que o advogado dos Bolsonaro, Frederick Wassef, disse que ele havia sido traído, enquanto sua mulher, Márcia, fala que o marido não entendeu que a sua vida na política acabou, porque Jair Bolsonaro o quer “sumido”.

Desculpem não me aprofundar mais agora, mas o ritmo em que surgem provas escandalosas do esgoto em que o Brasil está metido não está deixam aprofundar, ainda, as novas denúncias.

E isso de domingo para segunda, imagine ao longo da semana.

Vai ser necessária uma adaptação do tão citado João, 8:23: é mais correto dizer que “Conhecereis a verdade e a verdade o derrubará”



A lenda do Jair honesto, por Philipp Lichterbeck

'Ainda afirmar que Bolsonaro está do lado da lei e da ordem é uma piada de mau gosto. O bolsonarismo pode até ter algo contra a corrupção e a criminalidade – mas só a dos outros'

Por Philipp Lichterbeck | Coluna Cartas do Rio | DW Brasil
É claro que Jair Bolsonaro tem razão quando diz não poder saber tudo o que acontece nos 22 ministérios de Brasília. Consequentemente, não se pode responsabilizá-lo por cada ocorrência neles. No entanto, ele é responsável pela nomeação dos ministros, pelos aliados que procura e pelo espírito reinante em seu governo.

Além disso, Bolsonaro provavelmente não está dizendo a verdade, quando afirma nada ter sabido das irregularidades na encomenda da Covaxin. Segundo testemunhas, ele foi informado, mas não agiu. Ao que parece, tolerou e acobertou a suposta corrupção.

Seja como for, chama a atenção o governo brasileiro ter imposto altos obstáculos a todos os fabricantes de vacinas com representações diretas no país. Eles foram ignorados, suas ofertas, consideradas caras demais, ou se rejeitaram suas condições contratuais. Para os fornecedores com intermediários – no caso da Covaxin, registrados sob um endereço duvidoso em Cingapura – de repente essas ressalvas deixarem de ser relevantes. É o caso de se perguntar por quê.

Após a recente acusação de que o chefe de logística do Ministério da Saúde teria coletado subornos em nome de "um grupo dentro do ministério", alguns meios de comunicação escrevem que o governo Bolsonaro está passando por seu primeiro escândalo de corrupção. Isso é uma piada de mau gosto, e quem afirma tal coisa está caindo na armadilha da lenda bolsonarista sobre o "Jair honesto", um outsider meio grosso, porém sincero e defensor da lei e da ordem.

A versão que agora vem sendo repetida nas redes bolsonaristas é a de que esse governo não é corrupto. Isso é tão equivocado quanto a afirmação de que Bolsonaro seja um patriota, zele pela família ou respeite a Deus. Assim como conseguiu monopolizar os conceitos de patriotismo, família e Deus, ele conseguiu, diante de uma oposição fraca e desarticulada, reivindicar para si a luta contra a corrupção.

Basta enumerar alguns fatos para refutar esses mitos. As últimas férias de Natal do presidente Bolsonaro custaram ao contribuinte brasileiro nada menos que R$ 2,4 milhões. Ainda não estão explicados os 27 depósitos no valor de R$ 89 mil do suspeito de corrupção Fabrício Queiroz para a esposa do presidente, Michelle Bolsonaro. Também restam dúvidas sobre a compra de Flávio Bolsonaro de uma mansão em Brasília por R$ 6 milhões – o 20º imóvel adquirido pelo filho do presidente em 16 anos.

O fato é, antes, que este governo minou sistematicamente a luta contra a corrupção iniciada durante a presidência de Dilma Rousseff. Já em fevereiro de 2020, a ONG Transparência Internacional criticava as constantes "interferências políticas nas nomeações e destituições em postos fundamentais" para a luta contra a corrupção.

Bolsonaro, por exemplo, rompeu a tradição de nomear o procurador-geral da República entre a trinca eleita pelos integrantes do Ministério Público Federal. Assim como o chefe do antigo Coaf, que persegue a lavagem de dinheiro, ele substituiu o chefe da Polícia Federal do Rio de Janeiro (justamente a cidade em que seu filho Flávio é investigado por peculato, lavagem de dinheiro e supostamente liderar uma organização criminosa).

Desconfiar dos moralistas

Por diversas vezes, ainda, o presidente entregou cargos de ministro a suspeitos de corrupção, como o ex-chefe da pasta do Meio Ambiente Ricardo Salles (que no cargo aparentemente continuou a violar as leis), ou o do Turismo Marcelo Álvaro Antônio, ou o ex-secretário de Comunicação da Presidência da República Fabio Wajngarten.

Mais recentemente, Bolsonaro nomeou como ministra da Secretaria de Governo a deputada Flávia Arruda, do Partido Liberal (PL), presidido pelo ex-deputado Valdemar Costa Neto, condenado no mensalão. A lista poderia seguir adiante, aqui apenas os exemplos mais destacados: o atual líder do governo Bolsonaro na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP), foi alvo de operação do Gaeco do Paraná, suspeito de receber propina da Galvão Engenharia. E o atual líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB), é suspeito de ter recebido R$ 10 milhões em suborno de empreiteiras, quando era ministro da Integração Nacional. Esses são dois dos mais importantes apoios desse "governo honesto".

A tudo isso, somem-se os delitos e infrações pequenos e maiores do presidente para mostrar que não se pode admitir por um segundo sequer a afirmação desse governo de que estaria do lado da lei e da ordem: não respeitar a obrigatoriedade de máscara, encorajar garimpeiros e madeireiros ilegais, ofender e ameaçar jornalistas, recomendar medicamentos ineficazes à população, constantes mentiras e distorções da verdade, etc.

O bolsonarismo pode até ter algo contra a corrupção e a criminalidade – mas só a dos outros. Quem crê em outra coisa, caiu na esparrela da máquina de propaganda bolsonarista. É preciso sempre desconfiar dos moralistas.