Diante de tantos ataques, dia após dia,
a jovem democracia brasileira parece órfã neste momento.
O presidente Jair Bolsonaro em cerimônia no Palácio do
Planalto. (Foto: Carolina Antunes/PR)
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“Jair Bolsonaro não entende, como
demonstra a cada dia, os limites que a República impõe ao exercício da
Presidência. Trata-se de uma personalidade que combina leviandade com
autoritarismo. Será preciso então que as regras do Estado democrático de
Direito lhe sejam impingidas de fora par dentro, como os limites que se dão a uma
criança”.
Assim começa o editorial “Fantasia de
imperador”, publicado na Folha deste sábado, o mais duro ataque já feito pela
grande imprensa a esse protótipo de ditador bananeiro.
Após 11 meses de horror, ameaças e
destruição, completados hoje, o indigitado ocupante do Planalto parte para a
ofensiva final contra as instituições democráticas.
São incompatíveis o presidente e a
democracia, enxovalhada por atos de pura demência da família imperial e seus
ministros, que não passam de asseclas deslumbrados, recrutados em algum
manicômio judicial.
Apesar de dar seguidas demonstrações de
insanidade, durante a campanha eleitoral e em seus 30 anos como parlamentar do
baixo clero, depois de ter sido afastado do Exército por insubordinação, este
desqualificado foi tratado com extrema indulgência pelos profissionais da
mídia, que não alertou o país sobre o perigo que estávamos correndo com a sua
eleição fraudada.
No segundo turno, trataram o professor e
o ex-tenente como se fossem iguais, e não os representantes de dois polos
absolutamente opostos: o da civilização e o da barbárie anunciada.
Aqui neste modesto Balaio fui muito
criticado por alguns leitores quando a campanha começou, por dar espaço ao
então inexpressivo e folclórico candidato, que ninguém levava a sério.
“Você fica dando muito espaço para esse
cara, sem partido nem tempo de TV, que não tem a menor condição de chegar
ao segundo turno”, me diziam.
Por conhecer bem a sua história e ter
informações de empresas que monitoram as redes sociais, eu chamava a atenção
para o grande esquema que estava sendo montado no submundo da internet, já
antes da facada de Juiz de Fora e da prisão de Lula, os dois episódios que o
levaram à liderança nas pesquisas e à vitória.
No dia mesmo da posse, com o filho
Carluxo 02, chefe das milícias virtuais, empoleirado no Rolls-Royce
presidencial, já dava para ter uma pequena ideia do desastre que nos aguardava.
Tratado pela imprensa como um ser
exótico, mas inofensivo, Bolsonaro se cercou de generais (são mais de 2,5 mil
militares no governo) e olavetes alucinados, a quem entregou Educação, Cultura
e o Itamaraty.
Nunca um “astrólogo filosófico” como
Olavo de Carvalho, caçador de ursos nos Estados Unidos e comparsa de Steve
Bannon, o guru de Trump, havia nomeado tanta gente na história da humanidade.
A elite brasileira achava tudo meio
estranho, mas ficou feliz com a entrega da política econômica, de porteira
fechada, a um dos seus, o economista Paulo Guedes, um bufão que nunca foi
levado a sério pela academia nem pelos seus pares do mercado financeiro.
Tendo como modelos o Brasil da ditadura
militar de Brilhante Ustra, o Chile de Pinochet e os Estados Unidos do amigo
Trump, ficaram pendurados na brocha, sem saber como tirar a economia do
atoleiro.
Assim como se elegeram, governam por fake
news, vendendo ilusões à sua seita de fanáticos.
Autor do livro “Existe democracia sem
verdade factual?”, o jornalista e professor Eugenio Bucci lembrou ao colunista
João Domingos, do Estadão, que a democracia é uma construção histórica, um
engenho social, um projeto humano:
“Sem cuidados, ela pode perder vigor e
desaparecer. A democracia existe porque existiram e existem seres humanos que
cuidam dela, com muito trabalho. Sem eles, nada feito”.
Diante de tantos ataques, dia após dia,
a jovem democracia brasileira parece órfã neste momento.
Sem oposição, sem freios, sem limites,
controlando os três poderes, a tropa bolsonariana avança rumo a um
autoritarismo feroz.
Respondo à pergunta do título do livro
de Bucci: não, não existe democracia sem verdade factual quando, num de seus
delírios, o presidente acusa, com a maior leviandade, o ator Leonardo DiCaprio
de tacar fogo na Amazônia.
Em tempo: nesta segunda, Eugenio Bucci
estará no programa “Ricardinho e Ricardão”, que apresento junto com o
jornalista Ricardo Carvalho (no Youtube da AllTV, às 19 horas).
Bom fim de semana.
E vida que segue.