"Quando perdemos a capacidade de nos indignarmos com as atrocidades praticadas contra outros, perdemos também o direito de nos considerarmos seres humanos civilizados." ― Vladimir Herzog

Obrigado pelo acesso ao nosso blog
!

Painel Paulo Freire, obra de Luiz Carlos Cappellano.

Painel Paulo Freire, obra de Luiz Carlos Cappellano.
#PauloFreireMereceRespeito #PatonoDaEducaçãoBrasileira #PauloFreireSempre

quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Não é delírio..., por Régis Barros

No caso do presidente, não há pensamento delirante, mas sim um pensamento desviante e por que não dizer perverso. 

*Por Régis Barros
Permitam-me refletir, psicopatologicamente, sobre o discurso do atual Presidente do Brasil na ONU. Vi que muitos descreveram o discurso como sendo "delirante". Certamente, essa definição ocorreu pela sequência deslavada de bizarrices e inverdades proferidas por ele. No entanto, isso não é delírio. O delírio é uma alteração psicopatológica que ocorre no conteúdo do pensamento, levando a um falso juízo da realidade. Algumas doenças psiquiátricas, que cursam com tais alterações no pensamento, tem, no seu bojo, o delírio como um dos sintomas psiquiátricos. No caso do presidente, não há pensamento delirante, mas sim um pensamento desviante e por que não dizer perverso. Há projeção de incompetência e culpabilidade no outro. É a oposição, é a mídia, é a televisão, é o mundo e, agora, sobrou até para o "índio" e o "cabloco". Todos eles são os culpados, menos o governo e o governante que governa. Não é delírio, pois não há um julgamento falso da realidade. O que há mesmo é um uso mentiroso de dados não reais. Há uma tentativa de mentir para jogar para platéia dos seus fanáticos apoiadores. Pelo contrário, a realidade aqui não é falseada por um pensamento adoentado. A realidade é distocida e atacada voluntariamente com objetivos claros e escusos. A doença do presidente não está no Eixo I das grandes síndromes psiquiátricas, mas sim no eixo II. Ou seja, na estrutura da personalidade. Portanto, temos uma condição egossintônica e de difícil mudança. Serão mais 2 anos duros e sofridos.

*Régis Barros é médico psiquiatra, mestre e doutor em saúde mental


Fonte: Publicado originalmente na página do Facebook da Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela Democracia - ABMMD - CE.

domingo, 20 de setembro de 2020

Paulo Freire, 99 anos: ‘A ditadura estragou este país e continua estragando hoje’

Nos 99 anos de nascimento de Paulo Freire, um dos maiores pensadores da educação, respeitado em todo o mundo, a lembrança de um encontro com a juventude

Encontro de Paulo Freire com público do antigo programa Matéria Prima, da TV Cultura (Reprodução/Centro Paulo Freire)

São Paulo – Um vídeo de três minutos com o pedagogo Paulo Freire (1921-1997) respondendo a pergunta de uma estudante – “O que foi a ditadura para a educação brasileira” – de tempos em tempos reaparece circulando de em redes sociais. A pergunta foi feita durante participação de Freire no programa Matéria Prima, da antiga TV Cultura. No dia em que se celebram os 99 anos de Paulo Freire, a RBA republica nota sobre esse dia em que o educador esteve cercado de adolescentes, falando ao mesmo tempo como um mestre e como se fosse um deles.

Matéria Prima lançou na televisão brasileira – que está completando 70 anos – um novo formato de programa de auditório, com protagonismo da juventude. Lançou também o apresentador Serginho Groisman, que se tornou atração de maior audiência na TV Cultura, na época, de 1989 a 1990 (depois Serginho mudou-se para o SBT, onde apresentaria o Programa Livre, antes de ir para a Globo e ficar quase dois anos na “geladeira” até ressurgir com o seu Altas Horas, sem a mesma pegada “livre” dos anteriores.

Na época em foi entrevistado, Paulo Freire era secretário da Educação da Prefeitura de São Paulo, gestão de Luiza Erundina (1989-1992), então no PT.  Em sua resposta à estudante, Freire diz: “Ora, puxa, esta é uma pergunta muito bacana”.

Paulo Freire, subversivo internacional

O educador, que trabalhou também no governo de João Goulart antes do golpe de 1964, lembra que foi preso após a deposição de Jango pela ditadura civil-militar por ter proposto ao país um método educacional respeitado no mundo inteiro. 

“Fui preso por ser considerado um perigoso subversivo internacional, inimigo do povo brasileiro e inimigo de Deus. Ainda arranjaram mais essa carga pra mim: ser inimigo de Deus”, ironiza.

“Puxa, a ditadura estragou este país da gente e continua estragando hoje. A ditadura não inaugurou o autoritarismo, porque o autoritarismo está entranhado na natureza da nossa sociedade. O Brasil foi inventado autoritariamente”, prossegue Freire, ponderando que o regime pós-64 deu um impulso muito grande para o crescimento do autoritarismo, da violência e da mentira. “Foi uma coisa trágica.”

“Deus queira, agora diria eu, que jamais (a ditadura) se reinvente. Que tomemos, menino e meninas, jovens e maduros, todos, tomemos um tal gosto pela liberdade, pela presença no mundo, pela pergunta, pela criatividade, pela ação, pela denúncia, pelo anúncio, que jamais seja possível a gente voltar àquela experiência de pesado silêncio sobre nós”, finaliza o educador.

O trecho desta pergunta começa no minuto 12:45 do vídeo abaixo, postado no YouTube pelo Centro Paulo Freire. A RBA sugere que seja visto na íntegra. Em 30 minutos, Paulo Freire fala também de ética, democracia, gestão pública e, claro, educação.



sábado, 19 de setembro de 2020

Bolsonaro mente, por Luis Felipe Miguel

Não é “Bolsonaro diz”, “Bolsonaro afirma”, “Bolsonaro declara”, “Bolsonaro opina”. É “Bolsonaro mente”.

Se a imprensa brasileira seguisse o compromisso sempre alardeado de relatar os fatos a seu público, todas as manchetes começariam com a expressão “Bolsonaro mente”.

Não é “Bolsonaro diz”, “Bolsonaro afirma”, “Bolsonaro declara”, “Bolsonaro opina”. É “Bolsonaro mente”.

A mentira é a base da comunicação de Bolsonaro e de seu governo. Ele mente sobre seus propósitos, mente sobre suas ações e mente também sobre fatos de conhecimento público.

O Brasil está há meses estacionado num patamar muito elevado de contaminações pelo novo coronavírus. Somos vice-campeões mundiais em mortos pela doença e temos uma das mais altas taxas de mortalidade como proporção da população – e Bolsonaro diz somos um dos países que menos sofreram com a pandemia.

O consenso científico é de que o baixo isolamento social é um dos principais fatores responsáveis pelo descontrole da Covid-19 – e Bolsonaro diz que ficar em casa é “conversinha mole”, “para os fracos”.

O fogo devasta o Pantanal, em proporções inéditas e com evidências irrefutáveis de que é obra humana, proposital – mas Bolsonaro diz que o Brasil “está de parabéns” na preservação ambiental.

Bolsonaro e seu governo mentem sobre a reforma administrativa. Mentem sobre as universidades. Mentem sobre as causas da carestia dos gêneros alimentícios. Mentem sobre o auxílio emergencial.

Quando não pode mentir, Bolsonaro omite. E quando é confrontado com aquilo que quer esconder, Bolsonaro agride.  Afinal, por que mesmo Michelle recebeu R$ 89 mil de Queiroz?

Bolsonaro não mente por ingenuidade, por equívoco ou por ignorância. Mente de caso pensado. Mentir, promover a mentira e impedir que o debate político seja baseado em fatos - eis a espinha dorsal de sua estratégia política.

Uma estratégia que é a manifestação mais radical da opção da nova extrema-direita (a alt-right dos anglófonos) pelo anti-intelectualismo, teorias conspiratórias e pós-verdade.

Às vezes, a cobertura da imprensa trata as mentiras de Bolsonaro como “opiniões”, portanto como parte legítima da controvérsia política. Às vezes, questiona-as apenas em espaços fora da reportagem factual, como colunas de opinião ou de checagem de dados. Às vezes, os fatos contrastantes são até citados no corpo do texto.

Mas, em todos os casos, fica em segundo plano o que é central: Bolsonaro mente.

Quando Bolsonaro se pronuncia sobre as queimadas, a pandemia ou seja o que for, ele escolhe mentir. Por que mente? A serviço de que interesses mente? O que deseja esconder com suas mentiras?

Se essas perguntas não estão no centro da cobertura, o que se faz apenas é propagar as mentiras de Bolsonaro.

Bolsonaro mente: essa seria a manchete de um jornalismo que não tem medo da verdade.

*É doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), professor titular livre do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Fundador do Demodê



Brasil ajoelhado aos pés dos EUA, por Jeferson Miola

"A presença do Secretário de Estado dos EUA Mike Pompeo [equivale ao cargo de chanceler] em território brasileiro usado como base para agredir a vizinha Venezuela comprova que, para um governo servil e subjugado, a subserviência e o capachismo não têm limites", diz o colunista Jeferson Miola sobre os interesses envolvidos na visita do secretário americano no Brasil

Mike Pompeo e Ernesto Araújo (Foto: Reprodução/Youtube)

A subserviência e o capachismo do governo Bolsonaro e do comando das Forças Armadas do Brasil aos EUA não têm limites.

Engana-se quem imagina que gestos vergonhosos, como a reverência do Bolsonaro à bandeira estadunidense e a celebração do 4 de julho na Embaixada dos EUA; a isenção de tarifa de etanol dos EUA; a entrega da base de Alcântara, e o financiamento, com orçamento nacional, de oficiais das Forças Armadas para servirem ao Comando Sul dos EUA, poderiam significar o fundo do poço que o Brasil seria capaz de alcançar em termos de ultraje e humilhação.

A presença do Secretário de Estado dos EUA Mike Pompeo [equivale ao cargo de chanceler] em território brasileiro usado como base para agredir a vizinha Venezuela comprova que, para um governo servil e subjugado, a subserviência e o capachismo não têm limites.

Bolsonaro se assume o tempo inteiro como um obediente vassalo do Trump.

Mas é ainda pior; porque, além disso, Bolsonaro ainda se vangloria de ser o verme rastejante que faz do Brasil um pária no sistema de nações.

Bolsonaro é um servo dos EUA a serviço da desestabilização, do caos e da promoção do conflito entre países-irmãos da América do Sul.

A escolha de fornecer infra-estrutura logística e territorial para as políticas intervencionistas e agressivas de Trump na região, que é crime de responsabilidade, pois fere o artigo 4º da CF, contribui para converter o continente sul-americano numa enorme e incontrolável Síria.

Hoje, conhecendo-se a relevância econômica, política e militar da China e da Rússia na Venezuela, está fora de dúvida que, em caso de agressão estadunidense, a região passaria a ser um foco mundial de conflitos e disputas geopolíticas, geoestratégicas, geoeconômicas e militares entre potências extrarregionais.

O governo Bolsonaro e seus militares deram mais um passo na conversão do Brasil ao posto ultrajante e humilhante de mero protetorado dos EUA; puseram o Brasil de joelhos perante seu “rei imperial”.

Com esta escolha ultrajante e que, além de inconstitucional, é criminosa, eles também estarão mergulhando o Brasil e o povo brasileiro em conflitos infames e insanos.

*Integrante do Instituto de Debates, Estudos e Alternativas de Porto Alegre (Idea), foi coordenador-executivo do 5º Fórum Social Mundial



A volta do Brasil ao Mapa da Fome mostra o fracasso do mercadismo caboclo, por Luis Nassif

Hoje em dia, o discurso está restrito a visões de curtíssimo prazo, um fiscalismo extremamente emburrecedor, que irá quebrar a cara na próxima esquina.

 

Em 2014 o Brasil saiu do Mapa da Fome, segundo o Indicador de Prevalência da Subalimentação da FAO. Para sair do Mapa, o índice ficou abaixo de 5%.

A FAO analisou dois períodos distintos: de 2002 a 2013 e de 1990 a 2014. Entre 2002 e 2013, a quantidade de brasileiros em situação de subalimentação caiu 82%. Entre 1990 e 2014, a a queda foi de 84,7. Em apenas 12 anos, com uma política azeitada, e sem consumir grandes volumes de recursos, o país logrou superar uma de suas maiores chagas.
 
A estratégia brasileira foi montada com 4 pernas:

1. Aumento da oferta de alimentos. A disponibilidade de calorias para a população cresceu 10%.

2. Aumento da renda dos mais pobres, com aumento de 71,5% do salário mínimo e geração de 21 milhões de empregos.

3. Programa Bolsa Família, com 14 milhões de famílias.

4. Governança, transparência e participação da sociedade com a recriação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea).

O relatório “O estado de segurança alimentar e nutricional no Brasil” detalha essas estratégias. Com base nos dados da FAO, o percentual de subalimentados no Brasil ficou em 1,7% apenas.

O que mudou de lá para cá não foi a pandemia.

Os dados são anteriores ao Covid-19. Foram levantados pela Pesquisa de Orçamentos Familiares 2017-2018. No período, 36,7% dos domicílios, o equivalente a 25,3 milhões de lares, padeciam de algum grau de insegurança alimentar: 16,4 milhões com insegurança leve, 5,6 milhões com insegurança moderada e 3,1 milhões com insegurança grave.

A insegurança alimentar grave – aquela em que as pessoas chegam a passara fome – saltou para 4,6% dos domicílios, o equivalente a 10,3 milhões de pessoas, 7,7 milhões em áreas urbanas e 2,6 milhões em área rural.

O desmonte começou com a crise fiscal de 2015. Poderia ser superado nos anos seguintes. Mas, desde o governo Michel Temer começou o desmonte sistemático de todas as engrenagens de um estratégia que, durante algum tempo, serviu de modelo para o mundo.

Acabaram com o financiamento da agricultura familiar, com a merenda escolar, com a política de cisternas que ajudou o nordeste a enfrentar a seca, expurgaram o cadastro do Bolsa Família e do Beneficio de Prestação Continuada, com uma série de truques visando afastar os mais necessitados e menos informados. Desmontaram a rede de assistência social, esvaziar o Sistema Único de Saúde.

Não se trata apenas de insensibilidade social, próprio de sociedades selvagens, mas de uma ampla miopia em relação ao futuro. O aumento da fome desestrutura famílias, afasta crianças da rede escolar, expõe famílias a doenças e à marginalidade, reduz o mercado de trabalho e o mercado de consumo.

Mas o atraso institucional do país eliminou as vozes que tentavam desenhar o futuro. Hoje em dia, o discurso está restrito a visões de curtíssimo prazo, um fiscalismo extremamente emburrecedor, que irá quebrar a cara na próxima esquina. Ao transferir o discurso público ao mercado, desmontou-se a própria condição do mercado se inserir em um processo de crescimento saudável da economia.

O grande desafio será reconstruir o país depois desse terremoto medieval.

 

Fonte: Publicado no Jornal GGN

 

terça-feira, 15 de setembro de 2020

Mundo fracassou em cumprir metas para salvar a natureza, diz ONU

Relatório aponta que nenhum dos objetivos traçados há uma década para a proteção da biodiversidade foi cumprido. Degradação contínua do meio ambiente aumenta o risco de propagação de doenças, alertam Nações Unidas.

(Derramamento de óleo nas Ilhas Maurício em julho ameaça recifes e outras áreas ricas em biodiversidade)

Governos de todo o mundo falharam em cumprir as promessas traçadas há uma década para proteger a biodiversidade global, apontou um relatório da ONU publicado nesta terça-feira (15/09).

Em 2010, mais de 150 países chegaram a um acordo sobre 20 metas a serem alcançadas até o fim da década com o objetivo de salvar as espécies em extinção na Terra e preservar os ecossistemas em declínio. Mas nenhuma das metas foi totalmente cumprida, e apenas seis delas foram consideradas parcialmente alcançadas, concluiu a organização.

O documento é particularmente significativo pois funciona como um "boletim final" para as chamadas Metas de Aichi, traçadas no início da Década da Biodiversidade das Nações Unidas. 

Entre os objetivos estavam, por exemplo, a desaceleração do desmatamento, conservação de áreas úmidas e a conscientização do público sobre a importância da natureza para um planeta saudável. 

O relatório apontou, porém, que o uso de pesticidas e a poluição causada pelo descarte de plástico não foram reduzidos a níveis seguros; governos ainda subsidiam negócios que danificam os ecossistemas; e os recifes de coral continuam sendo atingidos por uma ameaça tripla: mudança climática, poluição e pesca predatória.

"Os sistemas vivos da Terra como um todo estão sendo comprometidos, e quanto mais a humanidade explora a natureza de maneiras insustentáveis, mais minamos nosso próprio bem-estar, segurança e prosperidade", alertou Elizabeth Maruma Mrema, secretária-executiva da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (CBD), que divulgou o relatório.
(Descarte excessivo de plástico continua sendo uma das preocupações da ONU)

A preocupação com os impactos ambientais causados pelo ser humano e seu estilo de vida predatório aumentou ainda mais em meio à pandemia de coronavírus, que provavelmente se originou num mercado de animais silvestres na cidade chinesa de Wuhan.

De acordo com os cientistas, a perda "sem precedentes" de biodiversidade e a destruição dos espaços selvagens aumentam o risco de doenças de animais migrarem para seres humanos.

"À medida que a natureza se degrada, surgem novas oportunidades para a disseminação de doenças devastadoras, como o novo coronavírus. A janela de tempo disponível é curta, mas a pandemia também demonstrou que mudanças transformadoras são possíveis", afirmou Mrema.

Seguindo essa mesma linha, o secretário-geral da ONU, António Guterres, disse que as transições descritas no relatório representam uma oportunidade sem precedentes para uma "reconstrução" global, à medida que o mundo emerge dos impactos imediatos da pandemia de covid-19.

"Parte dessa nova agenda deve ser enfrentar os desafios globais de uma maneira mais coordenada, entendendo que as mudanças climáticas ameaçam minar todos os outros esforços para conservar a biodiversidade. E que a própria natureza oferece algumas das soluções mais eficazes para evitar os piores impactos de um planeta em aquecimento", comentou.

Atualmente, cerca de 17% das terras continentais estão resguardadas por mecanismos de gestão ambiental. As Nações Unidas estão pressionando os governos a reservarem 30% das áreas terrestres e marítimas do planeta para a conservação. A negociação deve ocorrer na próxima Conferência da ONU sobre as Mudanças Climáticas, a COP26, adiada para 2021 em Kunming, na China. 

Nem tudo é negativo

Embora o fracasso no cumprimento das metas seja motivo de preocupação, os autores do relatório frisam que praticamente todos os países estão atualmente tomando algumas medidas para proteger a biodiversidade, sem as quais o estado da biodiversidade do planeta estaria consideravelmente pior.

O relatório cita exemplos positivos, como um programa ambiental no Paquistão que protege o leopardo-das-neves ao conservar os ecossistemas do Himalaia, e o caso da população de íbis-de-crista, uma das aves aquáticas mais ameaçadas de extinção, que começou a ter filhotes após conservacionistas libertaram pássaros criados em cativeiro no Japão.

FA/rtr/ots



quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Alta no preço do arroz é resultado do modelo de ‘fazendão’, diz Pochmann

Sem projeto de desenvolvimento, economia brasileira fica refém das flutuações internacionais. Esvaziamento dos estoques da Conab impede a ação do governo no combate aos impactos dessas variações nos preços dos alimentos

Por Tiago Pereira | Economia - RBA
Estoques de arroz da Conab caíram de 1.629 toneladas,em 2015, para 22 toneladas atualmente. (Foto: Juliano Ribeiro/Secom/TO)

Para o economista Marcio Pochmann, professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), as elites econômicas brasileiras estão abrindo mão de um projeto nacional estratégico e do abandono do mercado interno como motor do desenvolvimento. O resultado é a maior vulnerabilidade às variações nos preços das commodities. É o que vem acarretando, por exemplo, a elevação do preço do arroz nos supermercados, com o saco de cinco quilos se aproximando dos R$ 40, em diversas capitais.

“O que nos resta é uma certa volta ao passado, em que a presença do Brasil na divisão internacional do trabalho se dá basicamente na forma de uma fazenda de oferta de produtos primários”, afirmou Pochmman em debate sobre as perspectivas do governo Bolsonaro na TVPT.

Por outro lado, o país também se torna mais dependente do exterior em termos de tecnologia. O próprio agronegócio, por exemplo, passou a importar insumos, como fertilizantes. Até mesmo a comercialização dos produtos agrícolas depende da participação de “tradings” estrangeiras. A degradação ambiental é outra consequência desse modelo agroexportador, segundo Pochmann.

O cientista político William Nozaki, professor de Ciência Política e Economia da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fesp-SP), destacou que a desvalorização do real frente ao dólar faz com que o produtor opte por exportar, em detrimento do mercado interno.

Além disso, o governo Bolsonaro promoveu um esvaziamento dos estoques da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que serviriam para conter essas flutuações, como no caso do arroz, por exemplo.

Em 2015, os estoques médios mensais de arroz da Conab ficaram em 1.629 toneladas. Em 2016, já na crise do golpe do impeachment de Dilma, caíram para 88 toneladas. No governo Temer, a média mensal ficou em torno de 30 toneladas mensais. Em 2019 e 2020, com Bolsonaro e Guedes, caíram para 22 toneladas mensais.

Continue lendo aqui


A crise do arroz e a cegueira generalizada do ultraliberalismo. Por Luis Nassif

Agora, cria-se esse círculo de prejuízos. Numa ponta, permite-se a continuidade das exportações de arroz, sem estoques reguladores. Na outra, garante a compra de arroz menos competitivo que o brasileiro.

Por Luis Nassif | Coluna Econômica - GGN

As altas do arroz têm uma explicação óbvia. Mas tão óbvia que é inacreditável a maneira como a mídia cobriu o episódio, aceitando acriticamente os argumentos do Secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida, e da Ministra da Agricultura Tereza Cristina. O mantra do livre mercado tornou-se uma praga que obscurece qualquer raciocínio.

Do lado de Sachsida a explicação simplista de que o governo colocou muito dinheiro nas mãos do pobre, que passou a comer mais. Do lado de Tereza Cristina, a explicação de que o produtor de arroz sofreu muito nos últimos anos e, agora, está tendo a oportunidade de se recuperar.

E os analistas se mostram solidários com os agricultores, enaltecem o livre mercado, dizendo que é assim mesmo. Não há o menor conhecimento sobre instrumentos clássicos de política de abastecimento.

O que ocorreu é simples.

1. Com a pandemia, países que pensam em seus cidadãos seguraram as exportações, para garantir o abastecimento interno. Com isso, houve redução na oferta mundial, elevando os preços do arroz.

2. Ao mesmo tempo, houve uma grande desvalorização do real, tornando os preços do arroz, em reais, muito mais atraentes, quando exportados.

3. O resultado óbvio é a elevação do preço interno do produto, para se alinhar com os preços internacionais.

4. Nesses momentos, o instrumento óbvio do governo são os estoques reguladores, mantidos pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). Acontece que do impeachment para cá, o ultraliberalismo dos governos Temer e Bolsonaro levaram à redução drástica dos estoques. Confira.

5. Ao mesmo tempo, permitiu-se a exportação indiscriminada de arroz. O resultado foi a redução da oferta e a explosão dos preços.

Há uma lógica política nisso tudo. Ruralistas fazem parte da base política desse ultraliberalismo. Estoques reguladores atrapalham os preços, especialmente quando explodem.

É evidente que uma política pública responsável deveria ter enfrentado os problemas dos plantadores de arroz na crise, adquirido a produção para montar estoques, impedindo prejuízos maiores. Mesmo porque a produção é essencial na mesa do brasileiro. Nada foi feito, e nada se cobrou. Porque, para o discurso atual do ultraliberalismo brasileiro, cada um por si e o país que exploda.

Agora, que ocorrem os problemas, deixa-se de lado qualquer solidariedade com o consumidor e passa-se a entender com complacência os movimentos de alta.

Finalmente, para completar o ciclo, o inacreditável Ministro da Justiça, André Mendonça, manda intimar supermercados a explicar a especulação. Não tem a menor noção sobre o mercado. Os supermercados são moderadores de preços, porque interessa o volume. E preços altos de compra, significam margens menores de venda e quantidades menores.

Agora, cria-se esse círculo de prejuízos. Numa ponta, permite-se a continuidade das exportações de arroz, sem estoques reguladores. Na outra, garante a compra de arroz menos competitivo que o brasileiro.

Continue lendo aqui 


Fonte: Publicado no Jornal GGN


sábado, 5 de setembro de 2020

Censura à Globo: quem deve guardar sigilo é a Justiça, não a imprensa. Por Fernando Brito

A Globo, que nunca lutou pela liberdade de imprensa, ainda assim deve ter a proteção das liberdades públicas, em nome do direito de informar.

A decisão da juíza Cristina Serra Feijó, da 33ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, de proibir a Globo de noticiar as informações que obtiver sobre a investigação das “rachadinhas” de Flávio Bolsonaro, sob o argumento de que correm em segredo de Justiça é, sem meias palavras, um decreto de censura prévia.

Ilegal, inconstitucional e um despropósito.

Segredo de Justiça é obrigação funcional, não limitação ao exercício da liberdade de imprensa.

Quem tem de ser responsabilizado pela sua quebra é quem “vaza” informações sigilosas, seja juiz, seja promotor, seja policial, seja advogado.

Se algo chega à imprensa e tem relevância pública, não cabe ao jornalista senão publicá-lo.

Se algum problema há é a criação de cumplicidade entre agentes de Estado e jornalistas e nos cabe, profissionalmente, cuidar que não sejamos engolfados por uma teia de interesses de partes, mas apenas perceber o que é de interesse público.

Um senador da República e filho do Presidente da República estar metido em achaques a servidores de seu gabinete, movimentar quantias em espécie sem origem definida e valer-se, para isso, de um ex-policial cheio de ligações com o submundo das milícias é, sem qualquer sombra de dúvida, um assunto público.

À juíza foge o respeito a um princípio legal: todo processo é, em princípio, público e só pode deixar de ser quando envolve questões íntimas (caso de ações de família, por exemplo) ou quando o seu conhecimento público ajuda a encobrir situações ilegais, que são de interesse público esclarecer.

No caso de Flávio Bolsonaro – e, de tabela, também de Jair Bolsonaro, cuja mulher recebeu depósitos sem explicação do operador das “rachadinhas” – trata-se de figura pública, detentor de mantado eletivo e, por isso, mais sujeito ao escrutínio público de seus comportamentos e de suas rendas pessoais.

A “vitória” que Flávio Bolsonaro está comemorando nas redes sociais é, está claro, uma derrota, porque a decisão absurda será logo derrubada.

A Globo, que nunca lutou pela liberdade de imprensa, ainda assim deve ter a proteção das liberdades públicas, em nome do direito de informar. Mesmo que, nos tempos da ditadura que ajudou a impor a este país, nunca tenha brigado por ele.



Debandada da Lava Jato indica que objetivos políticos foram cumpridos, diz jurista

Pedido de saída de oito procuradores expõe enfraquecimento da operação, que pode ser anulada, segundo o Transforma MP


Por Erick Gimenes | Brasil de FatoBrasília (DF)

Pressionado no cargo, Deltan Dallagnol deixou a Lava Jato - José Cruz | Agência Brasil

A debandada de procuradores da República da força-tarefa da Lava Jato em São Paulo é mais um sinal de que a operação cumpriu com seus objetivos políticos, segundo o fundador do Coletivo Transforma MP, o promotor Gustavo Roberto Costa, membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).

O pedido para sair de oito procuradores paulistas, na quarta-feira (2), deu-se um dia após a figura mais midiática da operação, Deltan Dallagnol, pedir para deixar a coordenação da força-tarefa em Curitiba.

Dallagnol estava pressionado no cargo e alegou problemas familiares. Para Costa, a tensão foi causada por setores do próprio MP e do meio político que se desinteressaram pelo trabalho “anticorrupção”.

“Cada vez mais a gente vê que essa ‘instituição’ Lava Jato, essa marca, se mostra como uma força-tarefa que tinha fins políticos muito específicos. Quando esses objetivos foram atingidos, com aquela bandeira de combate à corrupção, a Lava Jato passou a não ser mais interessante e passou a sofrer ataques dos órgãos de administração superior do Ministério Público, da classe política e até mesmo da mídia”, afirma o jurista.

Costa diz acreditar que a saída dos principais procuradores indica o fim das forças-tarefa, ao menos como eram antes estruturadas. “A tendência é que ela não exista mais como força-tarefa, o que também sempre foi muito discutível, se é possível juridicamente”, pontua.

Para o fundador do Transforma MP, caso a Lava Jato realmente definhe, é provável que todas as ações anteriores encabeçadas pelas forças-tarefa sejam anuladas na Justiça.

“Eu vejo uma chance imensa de tudo isso ser anulado, invalidado judicialmente. Temos indícios fortíssimos de nulidade processual, de atuações contra a lei, tratados internacionais, de quebra de imparcialidade judicial e do próprio Ministério Público, que deve ser um órgão imparcial”, avalia.

O promotor questiona por qual motivo a Lava Jato deixou de ser interessante para quem antes era. “A pergunta que eu faço é: por que cinco, seis anos atrás interessou que elas [as forças-tarefas] existissem, com o barulho que foi feito, com o show midiático que foi feito, e agora não interessa mais? Porque ninguém vai dizer para a gente que a corrupção acabou, que eles fizeram tudo o que tinham que fazer. Ninguém vai ser louco de dizer isso.”

A ofensiva contra a Lava Jato parte, principalmente, do procurador-geral da República, Augusto Aras. Foi ele que promoveu as mudanças internas na operação e enfraqueceu as principais figuras, principalmente Dallagnol.

De acordo com Gustavo Costa, a divergência de postura de Aras e de seus antecessores, Raquel Dodge e Ricardo Janot, causa questionamentos. Ele afirma que não é possível dizer a quais interesses o atual PGR atende, mas avalia ser razoável que a operação seja questionada.

“Alguns anos atrás, tínhamos uma Procuradoria-Geral da República absolutamente alinhada com a Lava Jato. Tudo o que vinha do MP do Paraná era aceito pela PGR de forma acrítica, automática. Agora, temos um procurador-geral que questiona esses métodos. Não sei o que o move a agir dessa forma. Se antes era tudo certo e agora era tudo errado, a gente precisa questionar. Por que antes a PGR era totalmente favorável à Lava Jato e agora ela é totalmente contrária?”.


Edição: Rodrigo Durão Coelho


Fonte: Publicado no Brasil de Fato