O julgamento desta quarta-feira nada
disse sobre Lula ou crimes, mas disse tudo sobre os desembargadores da 8ª Turma
do TRF-4
*Por Tania Maria de Oliveira ǀ Justiça - GGN
Em setembro de 2016, respondendo às
inúmeras ilegalidades cometidas na investigação, como grampos em escritórios de
advocacia, divulgação de interceptação telefônica e importação de provas da
Suíça, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu que a operação Lava
Jato não precisava seguir as regras dos processos comuns. Para a Corte Especial
do órgão, os processos “trazem problemas inéditos e exigem soluções inéditas”.
Ao julgar, nesta quarta-feira (27), a
apelação criminal do processo do Sítio de Atibaia, no qual é réu o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os três desembargadores, que compõem a
8ª Turma daquele mesmo Tribunal Regional Federal da 4ª Região confirmaram, com
mais clareza do que antes, a tese de 2016, que as ações da Lava Jato em geral e
do ex-presidente Lula em particular, são processos de exceção. Para sedimentar
esse caminho, contradisseram sua própria jurisprudência, não antiga, mas
recente. E, de forma imponderada e arrogante, pretenderam decidir o momento da
aplicabilidade de julgado do Supremo Tribunal Federal, ao negar-lhe vigência.
Além de exaustiva fundamentação, diante
da ausência de provas a configurar os crimes de corrupção passiva e de lavagem
de dinheiro, o Tribunal aumentou a pena de 12 anos e 11 meses para 17 anos, 1
mês e 10 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e pagamento de 422
dias-multa.
A pretensão de explicação para
prosseguir na persecução, e realizar a análise do mérito sobre a propriedade do
Sítio e o cometimento de crimes, exigiu dos juízes a superação das preliminares
apresentadas pela defesa, dentre as quais o fato de que a juíza Gabriela Hardt
copiou, formal e materialmente, trechos da sentença do juiz Sérgio Moro,
proferida no caso do Triplex, e de que houve descumprimento da ordem sucessiva
das alegações finais, tendo em vista que delatores falaram no mesmo prazo do
delatado.
No dia 13 de novembro de 2019, os mesmos
juízes anularam sentença em Apelação, oriunda também da 13ª Vara Federal de
Curitiba, em decorrência de ter a juíza Gabriela Hardt copiado e colado
argumentos de outras peças processuais. O entendimento foi de que “reproduzir,
como seus, argumentos de terceiro, copiando peça processual sem indicação da
fonte, não é admissível”, e que a sentença afrontaria, portanto, o artigo 93,
IX, da Constituição Federal, que determina que todos os julgamentos do Poder
Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões.
Tratava-se se de uma ação que não faz
parte daquelas vinculadas à operação Lava Jato, em que a juíza reproduziu
trechos da manifestação de alegações finais do Ministério Público Federal.
Na oportunidade, o desembargador Leandro
Paulsen, acompanhando integralmente o voto do relator João Pedro Gebran Neto,
salientou que decidiu se manifestar no acórdão para que em futuras sentenças o
mesmo vício não seja reproduzido.
Em fevereiro de 2019, a defesa do
ex-presidente Lula solicitou a juntada aos autos de uma perícia feita pelo
Instituto Del Picchia, que demonstra cabalmente que a mesma magistrada copiara
trechos da sentença do então juiz Sergio Moro, no caso do tríplex do Guarujá,
tanto formal quanto materialmente, chegando ao absurdo de trechos repetidos, e
citação ao “apartamento”, e de tratar José Aldemário e Leo Pinheiro
como sendo duas pessoas distintas. A resposta dos desembargadores nesta quarta
de que a juíza poderia estar “cansada” e que repetição de trecho é “mera
coincidência” é um escárnio com a seriedade que a Justiça demanda.
No dia 26 de setembro último, por
maioria de 7 votos a 3 o STF decidiu qual deve ser a ordem das alegações finais
em ação penal: primeiro devem se manifestar os delatores e, posteriormente, o
delatado.
No caso da Ação Penal do Sítio de
Atibaia, a manifestação do ex-presidente Lula se dera no mesmo prazo dos réus
delatores. No entanto, a 8ª Turma do TRF-4 afirmou que não houve prejuízo
comprovado, coisa que absolutamente não foi decidido pelo Supremo Tribunal
Federal como requisito ou condicionante para o exercício do Direito e
reconhecimento da nulidade. Apenas o voto da ministra Carmen Lúcia falou de
nulidade relativa, condicionada à comprovação de prejuízo, o que não
modificaria a maioria. O Acórdão não foi lavrado porque o presidente Dias
Toffoli disse que faria ponderações ao julgado, mas não houve condições para a
decretação da nulidade.
Por outro lado, quando o relator Gebran
afirma discordância que a decisão do STF já tenha validade para casos passados,
defendendo que a medida seja adotada apenas em julgamentos futuros, ele burla
ao mesmo tempo a aplicação do conceito de anterioridade em matéria penal em
favor do réu, que garante sua necessária estabilidade e coerência, bem como o
respeito ao princípio da legalidade, tão caro ao Direito Penal democrático, e
indevidamente interfere na aplicação a ser dada aos casos em andamento por
decisão da Suprema Corte.
O julgamento desta quarta-feira nada
disse sobre Lula ou crimes, mas disse tudo sobre os desembargadores da 8ª Turma
do TRF-4: eles levarão a farsa que é a Lava Jato até o fim, condenarão Lula
contra toda lógica, razoabilidade e independente da inexistência de quaisquer
provas. Para isso estão dispostos a passar por cima de tudo, a rejeitar a
mínima coerência com o que dizem, pensam e escrevem em idênticos processos.
Pior, estão propensos a aniquilar o Direito.
*Integrante da Executiva Nacional da
ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia)
Fonte: Publicado no Jornal GGN
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