Brasília
A
divulgação do grampo de uma conversa entre a presidente Dilma Rousseff e o
ex-presidente Lula mostra que está sendo travada uma guerra aberta entre o juiz
Sérgio Moro e o Palácio do Planalto. Moro agiu em retaliação à nomeação de Lula
para a Casa Civil.
Numa
ação relâmpago, Moro quis causar um dano antes de as investigações saírem das
suas mãos e tomarem outro rumo. Isso é perigoso. Um juiz não deve agir
politicamente. É frágil o argumento de justificar a divulgação como uma forma
de atender ao interesse público e de mostrar que autoridades agiriam na sombra.
Nesse
caso, o juiz deveria ter divulgado antes, não no dia em que houve a decisão que
levaria a investigação sobre Lula para o Supremo Tribunal Federal.
A
exposição de um material desse tipo, sem denúncia contra Lula, sem uma decisão
judicial num processo em que ele seja réu, é uma forma de julgamento sumário,
de justiçamento. Não é correto um juiz agir como justiceiro.
Há
ainda dúvida sobre a legalidade da escuta: a conversa com a presidente Dilma
foi gravada às 13h32, duas horas e vinte minutos depois de o próprio Moro ter
mandado interromper a vigilância. Essa conversa foi tornada pública em tempo
recorde, no início da noite, por volta das 18h.
Pelo
teor explosivo e pelo potencial de dano, a divulgação às pressas teve a
intenção de obter um efeito político. Incendiou o debate público no país.
O
juiz Sérgio Moro tem qualidades, mas agiu ontem de forma irresponsável. Já
havia divulgado uma nota no dia das manifestações dizendo que autoridades têm
de ouvir as ruas. No domingo, fez uma manifestação política, o que é inusual
para juízes, que não devem antecipar seu voto em casos que analisam.
Ontem,
em poucas horas, a Polícia Federal gravou uma conversa na qual estava a
presidente. Moro a divulgou em seguida. Imediatamente, houve um julgamento
público negativo contra Dilma.
Isso
incendiou a manifestação em frente ao Palácio do Planalto, onde houve cenas de
pancadaria e uma bomba caseira foi atirada contra a rampa. Um casal foi
agredido na avenida Paulista porque a moça não concordou com manifestantes
contrários a Lula. Isso não é bom para a democracia, porque estimula a barbárie
e não o processo civilizatório.
Lula
e Dilma têm de responder por seus atos. Não estão acima da lei. Mas juízes
também não. Se uma conversa da presidente é divulgada perante o tribunal da
opinião pública em algumas horas e há um julgamento sumário que a condena,
imagine o que pode acontecer em relação aos cidadãos em geral.
Mais:
existem também trechos irrelevantes, sem nenhum interesse público, como a
conversa entre Lula e o prefeito do Rio, Eduardo Paes. Esse diálogo só serve
para desgastar o prefeito quando ele opina sobre o suposto “gosto de pobre” de
Lula. Não há como uma conversa desse tipo ser de interesse público.
O
ministro Gilmar Mendes, em entrevista à CBN, disse que os grampos foram legais.
Há advogados que discordam, sob o argumento de que a escuta não poderia ter
continuado depois das buscas e apreensões já feitas na operação Aletheia.
Isso será objeto de debate jurídico. Os investigadores sustentam a legalidade
da medida.
A
respeito do diálogo entre Dilma e Lula, há margem pra dúvida. A primeira
leitura sugere que Dilma está indicando Lula para blindá-lo da investigação em
Curitiba. Os investigadores interpretaram o diálogo nesse sentido.
Dilma
liga para Lula, diz que está mandando o termo de posse para ser usado “em caso
de necessidade”. Isso tem aparência de ilegalidade.
Mas
um ministro ressalta que ela disse: “…mandando o Messias junto com o papel… pra
gente ter ele. E só usa em caso de necessidade, que é o termo da posse, tá?”.
O
governo argumenta que foi enviado um termo de posse para Lula assinar e o “pra
gente ter ele”, dito pela presidente, significaria que o papel voltaria às mãos
dela. O “em caso de necessidade” seria uma eventual ausência de Lula devido a
uma enfermidade de dona Marisa, o que impediria o ex-presidente de comparecer à
posse hoje.
No
entanto, há uma questão que precisa ser esclarecida: ao longo do dia de ontem,
petistas e ministros falaram que a posse seria na terça-feira. Ao final do dia,
o governo comunicou que a posse seria hoje e as transmissões de cargo na terça.
Tem um ruído aí.
Voltando
ao diálogo: o “só usa em caso de necessidade” seria para Lula apresentar e
evitar uma medida de Moro, como um eventual pedido de prisão? Ou para o governo
usar caso Lula não viesse a Brasília hoje?
O
governo divulgou um termo de posse assinado só por Lula, sem a assinatura da
presidente Dilma e sem data. O governo argumenta que isso isenta Dilma, porque
não serviria para blindar Lula caso houvesse, por exemplo, uma ordem de Moro
contra ele.
Esse
diálogo pode derrubar a presidente da República. É preciso analisá-lo com
mais cuidado. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a quem cabe
investigar Dilma, deverá fazê-lo com mais serenidade.
Todas
as autoridades do Executivo, do Legislativo e do Judiciário também devem atuar
com serenidade, bem como os jornalistas. É preciso incentivar o processo
civilizatório, não a barbárie.
Fonte: Blog do Kennedy
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