Não sairemos da situação da pós-pandemia se não sobrevivermos como sociedade durante o período pandêmico. É urgente trazer de volta alguma razão no debate coletivo e na esfera pública e, assim, bloquear a estupidez do debate da extrema-direita, retroalimentado pela pregação de fariseus oportunistas. No Brasil é preciso, minimamente, golpear duro a dois inimigos: o delírio da extrema direita e sua manipulação de massas tratadas como o gado da canção de Zé Ramalho, e o modelo econômico sociopata e entreguista de Paulo Guedes e sua trupe de Chicago Boys.
Por Bruno Lima Rocha (*)
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(Foto: TV Brasil) |
O debate a
respeito do isolamento social e os planos macabros da aliança entre um
pensamento obtuso e a ação de desmonte na política econômica, estão levando uma
parcela do país às raias do delírio. Não abordo aqui a lerda e insuficiente
política de emergência econômica, pouco sendo implementada pelo ministro da
Economia, o Chicago Boy de carteirinha, Paulo Guedes. Também não vou abordar o
fato do enquadramento de Jair Bolsonaro pela alta cúpula das forças armadas, a
partir do final de semana de 28 de março de 2020. Faço aqui um breve debate, em
que estamos diante de um delírio manipulado, mas que ganhou arraigo no Brasil e
grudou no bolsonarismo como uma identificação para além do eleitoral.
Isolamento social e manipulação de massas a favor do
capitalismo de desastre
Primeiro é
preciso reforçar que temos colegas, profissões, áreas de estudo que se debruçam
sobre temas como convivência humana, relações sociais, o inconsciente, níveis
de interação e reintegração social. Dito isso reconheço o estudo de
especialistas e reforço apenas o que é evidência. Somos uma espécie gregária,
que depende das relações sociais e se integra em distintas etapas da vida
coletiva. Vivemos de forma coletiva e não individualizada, não atomizada.
Nosso espanto é saber
que a ênfase nas atividades remotas, à distância, era muito elogiada pelos
entusiastas do capitalismo na etapa da “acumulação flexível”, em trabalhos que
podem ser realizados através de mediação cibernética. Logo, nos espantamos
diante dessa situação. Precisamos ver a luz do sol, sair às ruas e até tocar
nas mercadorias, cujo fetiche tanto fortalece o consumo inconsciente. Ocorre
que, neste momento, estamos diante de uma situação de calamidade,
precavendo-nos da maior expansão da pandemia, conforme nos orienta corretamente
a Organização Mundial da Saúde (OMS).
O impacto do
isolamento é ainda maior nas camadas mais vulneráveis e empobrecidas da
sociedade. Não é porque estamos diante do isolamento social que, tanto as
diferenças sócio-econômicas como as mais variadas formas de exploração e
opressão, deixam de existir. Logo, as dificuldades aumentam conforme a posição
na, muito injusta, pirâmide social brasileira.
“Não era depressão, era capitalismo”. O isolamento social e
a solidão no mundo individualista
Certa vez me
perguntaram: “como combater os sentimentos de solidão?”. Não estou apto para
responder a uma pergunta como essa. Posso dizer, sem nenhuma sombra de dúvida,
que os direitos coletivos devem ser exercidos, defendidos e protegidos. O mesmo
se dá no conceito de “felicidade”. É muito importante reconhecermos os saberes
que se concentram na área da psicologia social, das terapias, da área da saúde
mental, saúde coletiva, educação física, fisioterapia e afins. As relações
sociais são muito complexas e devemos nos debruçar também sobre a área das
humanidades que estudam a temática, de modo a convivermos com algum grau de
harmonia, sempre que as condições materiais e de respeito coletivo sejam
preservadas. Assim, respondo que é muito importante reconhecermos o estatuto de
“especialistas” para discorrer sobre temas complexos e superarmos os “achismos
e senso comum”, marcados pelas notícias falsas. Uma vez que o bolo fecal
simbólico foi despejado, estes conteúdos fétidos circulam pela internet.
Logo, além daquilo
que pode ser alcançado pela luta auto-organizada, o mais relevante é
defendermos tanto o Sistema Único de Saúde (o SUS), quanto estar de guarda alta
na defesa incondicional do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Somente
as políticas públicas e a organização social podem nos salvar da pressão
advinda dos desesperos cotidianos do capitalismo periférico e do entreguismo
pós-colonial que chafurda no Brasil.
Isolamento social e a “opinião” a respeito
Outra pergunta
que se repete desde o pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro, veiculado em
13 de março, é se estão corretas as orientações da Organização Mundial de Saúde
(OMS) para conter a pandemia. A resposta que posso tentar desenvolver nestas
condições é OPINAR com base científica, seguindo as orientações da OMS, e
repetindo experiências históricas de como os países enfrentaram e saíram de
situações limite com medidas de planificação da economia e injeção de liquidez
para a geração de renda das famílias, trabalhadores/trabalhadoras formais e informais
e micro e pequenas empresas.
Qualquer
orientação que não repita minimamente aquilo defendido pela OMS (isolamento
social), na ONU (renda básica universal) e na área econômica do G20 (menos o
Brasil, com ingresso de dinheiro novo e acabando com a falácia do teto de
gastos), está errada. Não só errada como reflete a sociopatia de um pequeno
número de brasileiros muito privilegiados e que não querem abrir mão de um
modelo econômico concentrador, que fragiliza o emprego formal e aumenta a
vulnerabilidade do país e das pessoas comuns.
Apontando conclusões
Não sairemos da
situação da pós-pandemia se não sobrevivermos como sociedade durante o período
pandêmico. É urgente trazer de volta alguma razão no debate coletivo e na
esfera pública e, assim, bloquear a estupidez do debate da extrema-direita,
retroalimentado pela pregação de fariseus oportunistas. Não custa lembrar que,
embora todos e todas queiramos ver milagres e que a fé possa realmente mover
montanhas, estamos em um país onde se transmitem, de forma tóxica, a “sessões
de curas” feitas por charlatães em TVs abertas, concessões públicas revendidas
por mercenários do baronato das comunicações. O efeito dessa sandice é ainda
maior do que as pregações absurdas do também charlatão Olavo de Carvalho e seus
asseclas cibernéticos.
Longe de mim
defender qualquer imposição cientificista, em geral dotadas essas imposições de
um elogio velado ao eurocentrismo e ao “mérito”. Mas, diante da pandemia e como
o que de menos pior foi gerado nas relações entre Estados e o sistema das
Nações Unidas, é necessário seguir as orientações das agências da ONU, tanto no
combate à pandemia como na urgente defesa de planos econômicos de tipo
keynesianos e alguns Planos Marshall para reconstruir os sistemas produtivos e
o tecido urbano mais empobrecido no momento pós-pandemia.
No Brasil é
preciso, minimamente, golpear duro a dois inimigos: o delírio da extrema
direita e sua manipulação de massas tratadas como o gado da canção de Zé
Ramalho, e o modelo econômico sociopata e entreguista de Paulo Guedes e sua
trupe de Chicago Boys.
(*) Pós-doutorando em economia política,
doutor e mestre em ciência política e professor de relações internacionais e
jornalismo (blimarocha@gmail.com / canal no Youtube,
Estratégia & Análise Blog).
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Fonte: Publicado no Sul21
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