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Afrânio Silva Jardim, um dos mais respeitados processualistas do Brasil |
PUBLICADO ORIGINALMENTE NO FACEBOOK DO AUTOR
A VERDADE É QUE TUDO NÃO PASSA DE UM “FAZ DE CONTA”. A NOSSA JUSTIÇA
ESTÁ “TERCEIRIZADA”. A SOCIEDADE CIVIL NÃO SABE E A GRANDE MÍDIA NÃO TEM
INTERESSE DE MOSTRAR. HIPOCRISIA OU CINISMO ???
O assustador é que estamos constatando que o pior se dá quando eles,
em muitos casos, não “terceirizam” suas decisões. O pior se dá quando
eles mesmos prolatam suas decisões !!! É terrível esta constatação. O
punitivismo, a mediocridade e a contaminação ideológica estão
desgraçando o nosso sistema de justiça criminal.
O dramático disto tudo é que o exemplo vem de cima, dos Tribunais,
inclusive dos superiores. Todos sabem que muitos (senão a maioria) dos
votos dos órgãos colegiados são elaborados pelos assessores. O pior é
que realizam julgamentos de vários processos em conjunto. Chamam
julgamento por ” listas” … Talvez por isso, poucos querem se aposentar
e, em parte, fingem que trabalham até os 75 anos.
Em órgãos jurisdicionais colegiados, alguns magistrados “pedem vista
dos autos”, com a maioria de votos já formada, e “fingem” não ter prazo
para retomar o julgamento. Na prática, retardam a proclamação do
resultado do julgamento com o qual não concordam ou julgam inoportuno.
No primeiro grau, é o mesmo “faz de conta”. Os estagiários,
secretários ou assessores do Ministério Público elaboram muitas de suas
peças processuais, o mesmo ocorrendo no âmbito das Defensorias Públicas.
Ademais, talvez a maioria das sentenças seja redigida pelos
secretários ou assessores dos juízes de direito, tudo se repetindo no
segundo grau de jurisdição.
Agora, com os chamados ” julgamentos virtuais”, tudo isto sairá do
controle (se é que existia…). Em outras palavras, ” liberou geral”.
Não é por outro motivo que estes “operadores do Direito” encontram
tempo para viajar e dar palestras, inclusive no estrangeiro. Escrevem
textos jurídicos e livros de Direito, embora nem sempre de muita
qualidade.
Fingimos tudo isso há muito tempo. Os Delegados de Polícia fingem que
presidem os inquéritos policiais e que presidem a lavratura de todos os
autos de prisão em flagrante. Juízes e membros do Ministério Público
fingem que não sabem.
Em alguns juízos, os membros do Ministério Público e/ou os Defensores
Públicos assinam os atos processuais sem que estejam presentes quando
da realização dos mesmos. Em alguns juizados especiais, a “bagunça” já
se encontra institucionalizada há muito tempo.
Casos há em que se procura, nos corredores do forum, algum advogado
apenas para estar figurando como defensor técnico de algum réu. Sem
conhecer o processo, este advogado nada faz de eficaz, apenas
legitimando mais uma farsa … É tudo um “faz de conta”.
Fingimos que fazemos o que efetivamente não fazemos e fingimos que não sabemos que os outros também fingem …
Muitos agentes políticos e funcionários públicos fingem não saber que
receber remuneração acima do “teto” viola a Constituição Federal,
segundo regra nela existente, de forma bastante clara. Fingem ser
eticamente sustentáveis as formas “engenhosas” para contornar o referido
impedimento.
Outros fingem que não está escrito, expressamente no Código de
Processo Penal, a exigência de desatendimento à prévia intimação regular
para justificar uma condução coercitiva. Eles fazem de conta que o
direito ao silêncio, assegurado na referida Constituição de República,
não impede a condução coercitiva dos investigados e réus para os seus
facultativos interrogatórios!
O Supremo Tribunal Federal “faz de conta” de que algo está escrito na
Constituição Federal ou “faz de conta” de que algo não está escrito na
Constituição Federal, segundo sua conveniência ou desejo pessoal de seus
ministros. Vale dizer, o Supremo Tribunal Federal “faz de conta” que
estamos em um verdadeiro Estado de Direito.
O Supremo Tribunal Federal “faz de conta” que o artigo 283 do
Cod.Proc.Penal não existe: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante
delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária
competente, EM DECORRÊNCA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO
ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão
temporária ou prisão preventiva. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de
2011).
Aliás,
magistrados e membros do Ministério Público “fazem de conta” que não
recebem subsídios acima do “teto” constitucional e que é legítimo
receber verbas “indenizatórias” duvidosas, sem recolher o imposto de
renda sobre elas …
Dizem que, se não for assim, a “Justiça” não funciona … É o chamado
“jeitinho brasileiro”. Falam em impunidade, com os presídios
superlotados… Se a polícia cumprisse 15% dos mandados de prisão já
expedidos, seria um verdadeiro caos em nosso país …
Talvez tudo isso seja resultante mesmo de uma certa dose de cinismo …
Precisamos de menos corporativismo. Precisamos de uma “nova ética
social”. Corrupção não se combate apenas com polícia e condenações
penais, sendo necessário que os agentes públicos sejam exemplos de
retidão e comportamentos absolutamente corretos.
Seria melhor que todos se unissem e se rebelassem contra este “faz de
conta”, denunciando estas mazelas à sociedade. Aqui estou dando a minha
modesta e isolada contribuição.
Acho também que a culpa destas “distorções” é de uma lei que ninguém consegue revogar, qual seja, A LEI DO MENOR ESFORÇO …
.x.x.x.
Afranio Silva Jardim é professor associado de Direito Processual Penal da Uerj. Mestre e Livre-Docente em Direito Processual Penal (Uerj).
Fonte: Diário do Centro do Mundo
Afranio Silva Jardim é professor associado de Direito Processual Penal da Uerj. Mestre e Livre-Docente em Direito Processual Penal (Uerj).
Fonte: Diário do Centro do Mundo
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