Por Nivaldo Souza
Colaboração para o UOL, em São Paulo
O ex-ministro e ex-presidente do STF Ayres Britto |
O ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Carlos Ayres Britto
participou do julgamento de um juiz e três desembargadores como
presidente do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), função exercida por
ele durante sete meses em 2012, quando também acumulou a chefia do STF.
Eles foram condenados à aposentadoria compulsória
por assédio sexual, improbidade, negligência e peculato. Juntos, os
quatro custam cerca de R$ 100 mil por mês aos cofres públicos e integram
um seleto grupo de 48 magistrados, condenados pelo CNJ, cujos
vencimentos chegam a R$ 16,4 milhões por ano. "É um valor que surpreende
e desagrada, porque o ideal é apurar judicialmente os erros", afirma ao
UOL.
Ayres Britto critica o fato de
magistrados "faltosos" serem alvos apenas de processos administrativos
conduzidos pelo CNJ, os quais têm como pena máxima a aposentadoria
compulsória com salário proporcional ao tempo de serviço.
O
ex-ministro avalia que a aposentadoria é válida em casos de erro
administrativo. Já para crimes sugere que seja criado um gatilho para
envio automático dos casos para a esfera judicial pelo Ministério
Público como ação penal. Depois de emitida sentença transitada em
julgado (quando não cabe mais recurso), Ayres Britto avalia que os
magistrados devam ser demitidos sem direito a salário vitalício como
acontece hoje. "É inconcebível um magistrado que age como um bandido",
diz.
Ele defende a revisão da Loman (Lei Orgânica da
Magistratura) para permitir a punição mais rigorosa. "Eu concordo com a
regulação dessa matéria o quanto antes, porque há ilícitos de tal
gravidade praticado por magistrados que exigem uma destituição, uma
demissão, uma desinvestidura forçada do cargo e não uma aposentadoria
proporcional ao tempo de serviço", avalia.
Predadores institucionais
O tema já foi alvo de uma proposta de emenda constitucional (PEC
53/2011), aprovada pelo Senado Federal em 2013 e estacionada nas gavetas
da Câmara dos Deputados. Mas o fim da aposentadoria compulsória de
magistrados voltou à ordem do dia em outubro, quando o presidente do
Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse ter pedido ao presidente da
Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para "agilizar" a votação da PEC.
Renan defendeu a PEC como "uma medida fundamental de combate à
corrupção e à impunidade, que acaba com a aposentadoria por juiz e
membro do Ministério Público como prêmio por ter cometido crime de
improbidade".
A declaração é parte de uma ofensiva de Renan contra o Judiciário, depois que Polícia Federal prendeu quatro policiais legislativos do Senado
suspeitos de atrapalhar investigações da Operação Lava Jato. O líder do
Senado é alvo de pelo menos 11 inquéritos no STF, sendo oito na Lava
Jato.
Ayres Britto evita comentar a fala do presidente do Senado
ou mesmo mencionar nomes, mas afirma que existem "predadores
institucionais" tentando inverter os artigos da Constituição de 1988. "É
preciso que as relações sejam institucionais e não personais", diz. "É
preciso muito cuidado com o momento de exacerbação que estamos vivendo e
buscar o equilíbrio entre as instituições."
O ex-presidente do
Supremo diz que o artigo 93 da Constituição determina como atribuição do
STF o encaminhamento ao Congresso de um projeto de lei regulamentando o
Estatuto da Magistratura, em substituição à Loman. "O que for do regime
jurídico central do magistrado é de figurar, nos termos da
Constituição, numa lei de iniciativa privativa do próprio Supremo."
O contrário, de acordo com Ayres Britto, inverte os polos de
responsabilidade entre os Poderes. "Tenho receio de que outras
instâncias iniciem individualmente e inconstitucionalmente o processo
Legislativo [de novas regras da magistratura]", afirma. "A matéria que
por natureza deva fazer parte do Estatuto da Magistratura iniciada por
outra instância de Poder pode vir a ser contestada [no STF], porque é
inconstitucional", sugere.
Embora desde 2012 o STF tenha
decidido que magistrados aposentados não têm direito a foro
privilegiado, a condenação no CNJ não gera uma ação penal
automaticamente. É preciso que o Ministério Público, um tribunal ou
mesmo um cidadão acione a Justiça para investigar o magistrado fora do
âmbito administrativo. No geral, os casos envolvendo juízes e
desembargadores caem no esquecimento após sair do CNJ.
Na madrugada do dia 30, deputados federais aprovaram o texto-base do pacote de medidas anticorrupção proposto pelo Ministério Público.
Com os novos tópicos apresentados e a derrubada de outros tantos, o
projeto ficou desfigurado e foi criticado por várias instâncias do
Judiciário, como a Procuradoria-Geral da República e a presidente do STF. Ele prevê punição a magistrados por abuso de autoridade.
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