'Os políticos que hoje buscam apoio de pastores e padres poderiam se enquadrar no perfil dos “falsos profetas”.'
Por Juan Arias
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Mais de 80% dos brasileiros que irão em outubro às urnas são de fé cristã, entre católicos e evangélicos. Os ateus quase não existem neste país. Os candidatos às eleições presidenciais
ou são de origem cristã ou fingem, pois todos eles procuram igualmente
neste momento as bênçãos de bispos e pastores, prostrando-se em templos e
catedrais, já que um punhado de votos bem vale uma missa.
Mas esses mesmos políticos que procuram proteção sob os
altares talvez não gostassem de escutar algumas frases, duras como
pedras, pronunciadas há quase 2.000 anos por Jesus Cristo
contra “os falsos profetas”, de quem dizia: “Vêm a vós disfarçados de
ovelhas, mas por dentro são lobos arrebatadores”. Como reconhecê-los?
Não só por suas promessas que podem ser vazias ou repletas de
hipocrisia, mas por seus feitos. “Pelos seus frutos os conhecereis.
Colhem-se, porventura, uvas dos espinhos e figos dos abrolhos?”
(Mt.7,16)
O cristianismo
primitivo se inspirava nas atitudes que haviam guiado a pregação do
Mestre, sobretudo em sua insistência contra o farisaísmo, a hipocrisia e
os que enganam as pessoas simples. Jesus gostava do sim ou do não. “Oxalá fosses frio ou quente! Mas, como és morno, nem frio nem quente, vou vomitar-te”, recorda o Apocalipse (3,15).
Se analisássemos essas afirmações taxativas das Escrituras
e as aplicássemos a muitos dos candidatos que se dirigem às pessoas em
busca de seu voto, veríamos que continuam atuais. Continuam vigentes os
disfarces, por exemplo, de candidatos que cresceram e prosperaram na
velha guarda do conservadorismo, do patrimonialismo, do caciquismo, e
hoje se apresentam disfarçados de “políticos renovados”, de novos
redentores. Acaso os espinheiros podem dar uvas?
Candidatos que se apresentam como os paladinos da moral e dos bons costumes
e não têm vergonha de confessar que o dinheiro do auxílio-moradia do
qual desfrutaram durante anos em Brasília sem dele precisar foi usado
“para comer gente”, eufemismo para pagar prostitutas.
Candidatos incapazes de serem frios ou quentes para conseguirem
agradar a todos, e que acabam provocando vômito, na gráfica expressão da
Escritura. Candidatos que, como canta Gilberto Gil, com palavras dizem sim e com os fatos dizem não.
Melhor os que são capazes de confessar que ninguém tem a pedra
filosofal para resolver todos os problemas acumulados em anos de
governos incompetentes ou ambiciosos, e que não oferecem mais do que
acreditam que poderão realizar.
Os representantes das igrejas católicas e evangélicas
deveriam estar atentos ao oferecerem acolhida e apoio em seus templos,
às vezes no anonimato da noite, àqueles políticos que em vez de irem se
inspirar na fonte dos Livros Sagrados comparecem como mercadores de
votos. Para eles há também uma passagem dura do Evangelho: quando Jesus,
ao entrar no templo de Jerusalém
e ver os vendedores fazendo comércio com os fiéis pobres, depois de ter
jogado as mesas no chão os repreendeu e lhes disse: “Minha casa é uma
casa de oração, mas vós fizestes dela um covil de ladrões” (Mt.21,12ss).
Os estudiosos das escrituras, tanto católicos como protestantes,
concordam que foi aquele gesto contra o comércio do sagrado a gota
d’água que levou as autoridades do templo, em conivência com as
autoridades civis romanas, a acabarem com a vida do profeta incômodo.
Às massas de cristãos que vão aos templos e escutarão neste período
de seus pastores religiosos os chamados para votar nos políticos, a
essas massas de gente pobre sempre à espera de um milagre que redima
suas penas, a elas é preciso recordar que nessa Bíblia que está nas mãos
de seus guias espirituais há uma passagem do profeta Ezequiel, dirigida
aos governantes e que hoje parece de uma pungente atualidade. Sobre
eles, diz:
“Vós não fortaleceis as ovelhas fracas; a doente, não a tratais; a
ferida, não a curais; a transviada, não a reconduzis; a perdida, não a
procurais; a todas tratais com violência e dureza. Assim, por falta de
pastor, e em sua dispersão foram expostas a tornarem-se presa de todas
as feras.” (Ez.34,4ss)
O Brasil precisa com urgência encontrar alguém capaz de sentir o
clamor dos que procuram quem possa reconciliar o país, que seja guia
sobretudo dos que sofrem o abandono, dos mais expostos aos perigos de
serem devorados por uma política capaz de olhar só para o próprio
umbigo, esquecendo-se do que realmente esta sociedade, embora irada e
dividida, parece estar procurando em vão.
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