Embora relatório mostre níveis
preocupantes, agência reguladora minimizou os índices, afirmando não haver
risco à saúde
Por Erick Gimenes
Brasil de Fato | Brasília (DF)
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Segundo estudo, um em cada cem alimentos pode causar sintomas de intoxicação em menos de um dia / Pixabay |
Um estudo apresentado pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) na terça-feira (10) apontou que ao
menos metade dos alimentos de origem vegetal consumidos no Brasil tem resíduos
de agrotóxicos. O relatório completo é intitulado Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para).
Ao todo, foram analisadas 4.616 amostras
de 14 alimentos de origem vegetal representativos da dieta da população
brasileira: abacaxi, alface, alho, arroz, batata-doce, beterraba, cenoura,
chuchu, goiaba, laranja, manga, pimentão, tomate e uva. Em 51% delas (2.362),
algum resíduo contaminante foi encontrado, conforme o estudo.
Segundo a Anvisa, as amostras foram
coletadas em estabelecimentos varejistas de 77 municípios brasileiros, exceto
no Paraná, que optou por não fazer parte do programa.
O relatório mostrou, ainda, que 23%
(1.072) dos alimentos analisados tinham concentrações de agrotóxicos superiores
ao Limite Máximo de Resíduos (LMR) estabelecido pela própria agência.
Outro dado relevante foi o de resíduos
com risco agudo, que podem provocar sintomas de intoxicação em menos de um dia
– 41 amostras foram assim identificadas, o que significa que um em cada cem
alimentos analisados tinha nível elevado de produto danoso à saúde.
Subnotificação
Mesmo diante do cenário apresentado, a
Anvisa afirmou considerar seguro o consumo dos alimentos.
"As inconformidades não implicam,
necessariamente, risco ao consumidor. O LMR é um parâmetro agronômico, derivado
de estudos de campo que simulam o uso correto do agrotóxico pelo agricultor.
Para avaliar os riscos à saúde, deve ser feita a avaliação do risco agudo e
crônico, que compara a exposição calculada com os parâmetros de referência
toxicológicos”, manifestou-se a agência, em nota.
"De cada duas garfadas, uma que você está comendo contém veneno."
Segundo o engenheiro Alan Tygel, da
coordenação da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida, o índice de
veneno nos alimentos estudados deve ser ainda maior, já que a Anvisa pesquisou
apenas 270 agrotóxicos dos 500 registrados no país. Ele faz alerta para a
minimização da Anvisa ao risco vigente.
“Saber que a população está comendo
alimento envenenado todo dia, pelo menos metade – de cada duas garfadas, uma
que você está comendo contém veneno -, é algo que nos deixa muito preocupados.
E saber que 1% dos alimentos pode provocar danos agudos, também é gravíssimo.
Isso traz um alerta de que a agência que deveria estar cuidando da saúde da
população, na verdade, está minimizando os danos”, critica.
Silêncio sobre produção orgânica
Tygel ressalta que, em nenhum momento, a
Anvisa sugere, no relatório, o consumo de alimentos agroecológicos, produzidos
sem nenhum tipo de componente químico. Para ele, o silêncio da agência
reguladora sobre as melhores formas de produção deseduca e desrespeita a
população.
O engenheiro afirma que a agência
naturaliza o consumo de agrotóxicos pela população, e a tacha a postura de
"leviana".
"Quando a Anvisa ignora a
existência de formas de produção sem agrotóxicos, ela está mostrando para a
população que ela realmente defende o interesse das grandes empresas, que é o
suposto uso seguro de agrotóxicos, o suposto uso racional de agrotóxicos,
quando a gente sabe que esse uso seguro não existe”, comenta o engenheiro.
No fim do relatório, a Anvisa recomenda
a revisão de alguns ingredientes ativos que apresentaram maior risco aos
consumidores, a fim de propor maior restrição. Além disso, propõe à própria
população que opte por alimentos da época, com identificação de produtor, e que
lavem os alimentos com água corrente.
Tygel elogia a posição, mas diz que, em
relatórios anteriores, pouca ou nenhuma ação foi tomada posteriormente.
“A gente vê com bons olhos essa
iniciativa de colocar os ingredientes ativos para reavaliação a partir dos
resultados do [relatório] Para. Mas, infelizmente, os últimos resultados de
avaliação mostram que a Anvisa considera com peso muito maior os estudos aportados
pelas empresas e acaba se colocando à serviço do grande capital, que são as
empresas de agrotóxicos”, finaliza.
Edição: Rodrigo Chagas
Fonte: Publicado no Brasil de Fato
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