Relatório da Câmara dos Deputados
aponta: retrocessos no MEC comprometeram política de alfabetização e direitos
humanos. Mas escolas militarizadas avançam, sem transparência e com aberrante
proposta pedagógica…
Por Cleo Manhas, no Inesc
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Escola Militar |
A Câmara dos Deputados vota hoje (10/12)
o relatório da Comissão Externa criada para
acompanhar o trabalho de gestão e planejamento do Ministério da Educação (MEC).
O documento é uma extensa e importante análise, que vai desde a execução
orçamentária, até os cargos de direção (DAS 5 e 6), apresentando questões
graves sobre o descaso com a política de educação por parte do atual governo, e
proporcionando informações que o próprio Poder Executivo não disponibiliza.
Ao apresentar o relatório, o Poder
Legislativo realiza um dos seus compromissos de fiscalização das ações
governamentais.
Nos debruçamos sobre o documento e
destacamos, a seguir, alguns pontos que merecem atenção, por serem ilustrativos
da ineficiência e retrocesso da atual gestão da pasta comandado pelo ministro
Abraham Weintraub.
Fim da educação para a diversidade
O fechamento da Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi), substituída pela
Secretaria de Alfabetização (Sealf) é um exemplo, pois a nova secretaria não
assumiu todas as ações da antiga e não realizou o que anunciou, que era a tal
“alfabetização acima de tudo”, já que as metas do Plano Nacional de Educação
(PNE) para alfabetização total e alfabetização funcional não se moveram.
Além de não combater o analfabetismo tal
qual a promessa feita, a Sealf não atuou nas áreas de educação indígena,
quilombola, jovens e adultos, ribeirinhos, e educação do campo como a Secadi
atuava. Essas pautas foram diluídas entre várias secretarias, que ao serem
pulverizadas, enfraqueceram. A educação para direitos humanos simplesmente
desapareceu.
As duas únicas dotações orçamentárias
dedicadas à Educação de Jovens e Adultos tiveram execução de menos de 1% até
novembro de 2019, o que indica a descontinuidade das políticas destinadas para
este fim. A Política Nacional de Alfabetização proposta por esta gestão
estabelece a prioridade da alfabetização indígena por língua portuguesa,
contradizendo frontalmente o Estatuto do Índio que determina que ― a alfabetização dos índios far-se-á na
língua do grupo a que pertençam e em português, salvaguardado o uso da
primeira.
A Secretaria de Articulação com os Sistemas
de Ensino (Sase), criada em 2011 depois da Conferência Nacional de Educação
(Conae), para ser a guardiã do PNE, também foi extinta. Além do PNE, a Sase
lideraria o acompanhamento de estados e municípios, proporcionando a efetivação
do Sistema Nacional de Educação, preconizado na Constituição Federal e
reforçado pelo PNE, que indicava que até 2016 o sistema precisava ser criado.
Ele não foi criado a tempo e agora, provavelmente, não será criado na vigência
desse atual Plano, especialmente com o fim da Sase.
Escolas cívico-militares
Ao mesmo tempo em que não está cumprindo
com os próprios compromissos com relação à alfabetização, o Ministério já
ampliou várias vezes o número de escolas que poderão se tornar
“cívico-militares”, no entanto, sem critério algum, ou evidências de que os resultados
poderão ser efetivos. E, principalmente, sem participação das comunidades
escolares neste processo.
A proposta não é transparente e não diz
de fato a que veio, já que separa o pedagógico do disciplinar, criando uma
aberração. Além disso, como o relatório reforça, o projeto não está no Plano
Nacional de Educação, ao qual a política educacional deveria estar submetida.
No que tange ao planejamento desta
gestão até o presente momento nada foi feito e está adiado para fevereiro de
2020, de acordo com os relatores, por estar totalmente submetido ao calendário
do Ministério da Economia. Há apenas alguns planos de trabalho pouco
consistentes, sem metas, distribuição de responsabilidades, prazos etc. Até
porque, houve danças de cargos ao longo de todo ano, com pouca qualidade nas
escolhas, muita gente sem experiência na área.
PNE
O PNE possui 20 metas, destas, apenas 4
foram atendidas parcialmente, e desde a sua vigência (2014), 4 não foram
descumpridas. Mais grave é a política de austeridade, com o teto dos gastos e
agora a PEC do Pacto Federativo, que tornarão impossível o alcance da meta de
financiamento ampliado e de criação do Custo Aluno Qualidade (CAQ), que lista
os insumos necessários para o cálculo do valor aluno/ano para o Fundeb.
Outra questão relevante destacada no
relatório é a dificuldade de mensurar algumas metas do PNE, pois não há dados
para vários indicadores, tais como: porcentagem de redes municipais e estaduais
com planos de carreira aprovados; porcentagens de docentes do ensino médio com curso
superior etc. Metas relacionadas à educação infantil, ensino médio,
alfabetização, educação superior, educação integral, dentre outras, ficaram bem
distantes do previsto até 2019. No entanto, os projetos apresentados pela atual
gestão, nada tem a ver com estas metas do PNE, mostrando total desinteresse por
uma Lei aprovada pelo Congresso e respaldada pela população.
Orçamento
Com relação ao previsto no Plano
Plurianual 2020/2023 em tramitação no Congresso e prestes a ser votado, não há
indícios sobre a correlação do que está proposto com o PNE, que deveria ser o
norteador da política, já que vigora até 2024. Além disso, metas e indicadores
são insuficientes para um monitoramento verdadeiro da política, seja por parte
do Legislativo, seja por parte da população.
A Educação foi a área mais afetada pelo
contingenciamento orçamentário. E mesmo que tenha acontecido a liberação de
recursos, as políticas foram prejudicadas, atrasadas, descontinuadas. As
universidades, por exemplo, foram bastante lesadas, pois o ensino superior
detém a maior parte dos recursos discricionários do MEC, sujeitos ao bloqueio.
Mesmo com o desbloqueio, cerca de R$
1bilhão de reais foram cortados definitivamente, conforme aventado em artigo publicado pelo Inesc em outubro. E além
do contingenciamento, em várias áreas e programas a execução foi bastante
lenta. O relatório informa que o Pronatec teve apenas 1% do orçamento empenhado
e o Programa Dinheiro Direito na Escola 24%. Das 4 mil creches prometidas até
2022, praticamente nada foi realizado no primeiro ano.
O relatório da Câmara dos Deputados é um
importante documento de denúncia da não política de educação executada por esta
atual gestão, que tem atacado cotidianamente todas as áreas, especialmente, as
universidades, alvos de declarações esdrúxulas, falsas e de tentativa de
desmonte por parte do ministro totalmente inábil para o cargo que ocupa.
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