A asfixia financeira do SUS trará de volta não apenas as epidemias e desassistência, como o tempo em que acesso à “saúde pública” era para poucos. Os prejuízos devem ser expostos. A sociedade precisa se mobilizar. Ainda mais quando temos uma pandemia de Coronavírus anunciada a combater.
*Por Jandira
Feghali
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(Foto: Arquivo/Agência Brasil) |
O Sistema Único de Saúde (SUS) foi
construído a partir de um debate intenso com a sociedade. Houve um tempo em que
os que não tinham carteira assinada eram tratados como indigentes e lhes era
negado o acesso aos serviços públicos de saúde. Inscrever a saúde como direito
de todos e dever do Estado na Constituição, universalizando o acesso, foi uma
enorme conquista. Responsavelmente foram garantidas fontes plurais para os
objetivos estabelecidos.
Começou a se travar, a partir daí, uma
luta de resistência e avanços, a depender do governo que estava no comando da
nação. Desde tentativa de desconstitucionalização do SUS, até profundas
asfixias financeiras.
Em um intervalo de três décadas,
passamos de um aporte de 30% dos recursos das contribuições sociais para vinculações
de recursos mínimos e, hoje, temos o absurdo limite “constitucional” que
estabelece um teto de gastos para custeio e investimento, apenas incrementado
pela inflação do ano anterior. Nenhuma ampliação de serviços, contratação de
profissionais, produção de medicamentos é possível sem retirar recursos de
outras políticas essenciais. É a famosa Emenda Constitucional 95, que só não
coloca teto para gastos financeiros, ou seja, para a dívida pública. Projeções
indicam que a participação dos investimentos em relação ao PIB, com as
limitações da emenda do teto, cairão 4 pontos percentuais até 2026. Na saúde,
as perdas somarão, apenas em 2020, R$ 14 bilhões.
Mais preocupante, no entanto, é a mais
nova investida contra o direito à saúde, na medida em que, depois da reforma da
previdência, avançam para o desmonte do serviço público com propostas de
reforma administrativa e do Plano Mais Brasil, apresentado por meio de três
Propostas de Emendas à Constituição (PECs 186, 187 e 188). Estas tratam de
situações de emergência fiscal e alterações em fundos constitucionais e no
pacto federativo. Um verdadeiro ataque a conquistas de diversas áreas, que
levará a forte redução dos serviços públicos. Caso sejam aprovadas farão com
que a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, reduzam despesas
obrigatórias quando forem atingidos determinados indicadores. Na prática, se a
economia vai mal o corte recai com força em áreas sociais cada vez mais
necessárias nesses momentos de crise.
E mais: as PECs promoverão a extinção
imediata da vinculação de recursos, uma conquista para a saúde e educação.
Mas, o ataque à saúde pública não para
por aí. Ainda se propõe extinguir o fundo social e a vinculação dos royalties à
educação e saúde. As perdas serão inestimáveis.
E o pano de fundo a justificar o
verdadeiro descaso com as políticas públicas atende pelo nome de “emergência
fiscal”. Mas, não aceitam que os dados apresentados como base sejam
questionados, mesmo que estes indiquem que não estamos em emergência fiscal! O
discurso se presta a passar uma imagem de um governo responsável com as contas
públicas, mas esconde sua real intenção: minguar os investimentos em políticas
públicas para beneficiar o sistema financeiro. Serão R$ 219 bi desviados para
pagamento aos bancos. É disso que se trata e isso precisamos combater.
A asfixia financeira do SUS trará de
volta não apenas as epidemias e desassistência, como o tempo em que acesso à
“saúde pública” era para poucos. Os prejuízos devem ser expostos. A sociedade
precisa se mobilizar. Ainda mais quando temos uma pandemia de Coronavírus
anunciada a combater.
Saúde não é mercadoria.
Em defesa da vida, uni-vos.
*Médica cardiopediatra, feminista e
atual atual Líder da Minoria. Relatora da Lei Maria da Penha, está em seu
sétimo mandato na Câmara Federal pelo PCdoB do Rio de Janeiro. É uma das
principais vozes em defesa da democracia dentro do Parlamento.
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