*Por Breno Altman
Os operadores da direita, especialmente aqueles
instalados nos monopólios da mídia, atuam desabridamente para minar a
influência política e eleitoral da esquerda.
Essa intervenção não se limita aos ataques diretos, entre os quais se
destaca a perseguição judicial através da Operação Lava Jato. No
portfólio conservador também reluz o plantio da cizânia e da confusão.
A mais recorrente dessas ações de sapa envolve a especulação sobre o
chamado “plano b” diante da hipótese de impugnação eleitoral do
ex-presidente Lula.
A conta é simples: se o PT e a esquerda morderem a isca e entrarem
nesse debate encomendado, será natimorta a batalha pela libertação do
ex-mandatário e seu direito à candidatura presidencial.
Como em qualquer combate, a existência de outro plano que não o da
vitória só pode resultar em rendição prévia. Na melhor das hipóteses, em
guarda baixa e frouxidão diante do inimigo.
Vários são, infelizmente, os que caem nessa esparrela, fazendo
objetivamente o jogo conservador, e disparam a cogitar soluções para o
suposto cenário sem Lula, dando a luta por perdida antes mesmo de
travá-la.
Isso é tudo o que a direita quer. Tanto porque desarma o petismo e
seus aliados para a batalha de todas as batalhas quanto porque produz
naturais reações defensivas, e até sectárias, de quem não aceita
levantar a bandeira branca antes sequer do primeiro tiro.
Foi o que ocorreu na última semana, por exemplo. O petista Jaques
Wagner, tratando jornalistas como se fossem amigos na sala de estar,
aparentemente facilitou a engorda da teoria de que o PT deveria se
preparar para a hipótese de apoiar o pedetista Ciro Gomes e indicar o
vice em uma fórmula coligada.
Há quinze dias, participação do ex-prefeito paulistano, Fernando
Haddad, coordenador do programa de Lula, em um seminário sobre questões
econômicas, com a presença do pré-candidato do PDT, também fora
manipulada para produzir dilacerações internas.
Vale registrar, por justiça aos fatos, que ambos desmentiram veículos
que deram ares de verdade e dissertação a tertúlias especulativas ou
eventos com assunto diverso.
O fato é que dirigentes políticos, ainda por cima em tempos de
guerra, não deveriam ser ingênuos ou se comportar como
livres-pensadores, engordando pautas jornalísticas e desidratando a
confiança dos militantes que eventualmente comandam.
Na mesma onda entraram certos intelectuais e publicistas, cujo
derrotismo ganha contornos alarmantes e os conduz para a busca de alguma
saída mágica que parte da consideração de serem favas contadas a
interdição de Lula e sua permanência na cadeia, contra as quais nada se
poderia fazer a não ser virar a página.
A esse derrotismo se mistura – ou até se sobrepõe – uma certa
incapacidade de reconhecer que a exclusão do ex-presidente não é apenas
carta eleitoral, mas a fronteira que determina o enterro da Constituição
de 1988 e o fim do pacto democrático então consagrado, estabelecendo um
cenário no qual toda a orientação política dos últimos vinte ou trinta
anos deve ser inteiramente revista.
O outro lado dessa moeda é o espírito de corpo, também ao gosto do
conservadorismo. Perante a hesitação no campo de batalha, lideranças e
militantes petistas sentem-se obrigados a delimitar território,
demarcando posição contra Ciro Gomes e outras opções não-petistas.
Pior ainda: o vírus da intolerância se alastra nesse ambiente,
resultando em vaias contra aliados, apesar do esforço em contrário da
presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, como ocorreu no Primeiro de
Maio em Curitiba, e outras atitudes que rompem com a imperiosa lógica
frentista que deveria prevalecer.
Essa é a tempestade perfeita: a combinação da vacilação de dirigentes
frente ao conflito determinante e autofagia dentro do campo popular.
A essa altura do campeonato, o que realmente importa é construir uma
gigantesca campanha, nacional e internacional, pela liberdade de Lula e
seu direito a participar das eleições. Campanha essa que deve e pode
contar com a participação de todas as forças antigolpistas, apoiadoras
ou não de seu retorno ao Palácio do Planalto.
Não seria aconselhável, nessa etapa, nem sequer misturar “Lula livre”
com “Lula presidente”: a unidade da esquerda, por ora, passa pela
primeira das consignas, sempre reforçada por uma construção programática
que a associe às demais lutas dos trabalhadores e às reformas de
caráter democrático, popular e anti-imperialista.
Por isso, têm a mesma natureza daninha, embora em proporções
distintas, tanto a claudicação diante da leitura de que eleição, sem
Lula, é fraude quanto o patriotismo petista contra outros candidatos.
A esquerda somente voltará a ter o queijo na boca se transformar sua
base difusa e passiva de apoio, majoritária na sociedade, em mobilização
unitária e massiva, soldando por esse meio uma alternativa viável de
governo.
Tal movimento precisa ter como norte a consolidação de uma coalizão
orgânica e programática de partidos, movimentos e cidadãos, no diapasão
que levou ao surgimento da Frente Brasil Popular e que dá o ritmo de sua
ação integrada com a Povo Sem Medo, ampliando para novos agentes e
setores do bloco antigolpista.
Esse processo, hoje, tem como eixo o futuro do ex-presidente Lula.
Seria desastroso se as forças progressistas, sequiosas pelo queijo,
caírem na ratoeira da capitulação sem combate ou do sectarismo
autodestrutivo.
*Breno Altman é diretor editorial do site Opera Mundi.
Fonte: Publicado no Opera Mundi
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