*Por Breno Altman
Pode parecer incrível, mas há vozes progressistas que
passaram a defender intervenção militar ou a especular sobre seu
eventual caráter positivo.
Não são apenas guerrilheiros de Facebook, aventureiros sem lastro ou falastrões em busca de fama.
Respeitáveis personalidades, como o professor Moniz Bandeira, talvez
movidos por esse catalizador alucinante que é o desespero político,
passaram a bater nessa tecla.
O delírio revela absurdo desconhecimento ou deformação do que sejam
nossas Forças Armadas, seu papel no Estado e sua trajetória histórica.
O sistema de três correntes foi esmagado após 1964. Até então,
disputavam hegemonia em seu interior os “entreguistas” (favoráveis ao
acoplamento integral do Brasil à economia capitalista mundial, liderada
pelos EUA), os “nacionalistas” (divididos entre fascistas e moderados,
advogavam um projeto de Estado forte e potência regional) e os
“progressistas” (oriundos do tenentismo de esquerda e inspirados por
Prestes, seu nacionalismo era de caráter democrático, anti-imperialista e
popular).
Essa ultima corrente, que em alguns momentos conseguiu atrair os
“nacionalistas moderados” (como o general Teixeira Lott, que garantiu a
posse de JK em 1955 e foi candidato a presidente apoiado pelo PCB em
1960), foi inteiramente expurgada depois de 1964, com o golpe liderado
pela aliança entre “entreguistas” e as duas vertentes dos
“nacionalistas”.
O denominador comum dessa coalizão militar, que passou a estruturar a
formação doutrinária das Forças Armadas, foi o anticomunismo visceral, o
ódio às ideias de esquerda.
Os conflitos desde então existentes passaram a ser dentro do mesmo
campo de classe: como deveriam se comportar os militares para defender o
Estado burguês e o desenvolvimento do capitalismo brasileiro.
Os “entreguistas” não mudaram quase nada, ainda que tenham passado a
considerar contra-producente o protagonismo político das FFAA, ao menos
enquanto estratégia.
Os “nacionalistas” de caráter fascista, como o general Mourão,
continuam a considerar que os militares são o único estamento capaz de
garantir que o capitalismo brasileiro possa ter autonomia e
estabilidade, destruindo seu inimigo histórico – a esquerda – e
enquadrando os quadros civis, medularmente corrompidos, da burguesia
brasileira.
Os “nacionalistas moderados”, como o general Villas Boas, foram os
que lideraram a retirada dos militares da cena política, passaram a
defender a profissionalização das Forças Armadas e seu papel de reserva
constitucional.
O que ocorre, no entanto, é que a crise econômica e institucional tem
enfraquecido esse setor, cada vez mais pressionado pelos neofascistas,
que começam a recuperar terreno no comando das tropas e na instituição.
Claro que esse cenário não coloca como próxima ou provável qualquer
intervenção militar, pois as circunstâncias internas e internacionais
são diferentes de 1964, mas é evidente – para qualquer um que acompanhe
as questões militares – que os “moderados” estão cedendo terreno tanto a
“entreguistas” quanto aos neofascistas. Além de Mourão, um elétron
livre, outro exemplo dessa situação é o peso adquirido pelo general
Sérgio Etchegoyen, atual chefe do Gabinete de Segurança Institucional.
Esses elementos deveriam ser suficientes para prevenir delírios sobre eventual função progressista de uma intervenção militar.
Se viesse a ocorrer tal ação, ela teria inequívoco caráter antidemocrático e antipopular.
Por essa razão, a denúncia implacável e a defesa da Constituição,
mesmo que esfarrapada pelo governo usurpador, são as únicas atitudes
consequentes das forças progressistas diante de ameaças como a proferida
pelo ex-chefe do Comando Sul.
Qualquer intervenção militar seria o golpe dentro do golpe, uma
variável cuja lógica estaria em estabelecer, mais uma vez, a ditadura
aberta do capital sobre a classe trabalhadora e o povo brasileiro.
*Breno Altman é diretor editorial do site Opera Mundi. Apresenta os programas "20 Minutos História" (às terças-feiras ) e "20 Minutos Atualidade" (às sextas-feiras), com transmissões ao vivo na página do Facebook e no canal no youtube, do Opera Mundi. Acesse, curta, compartilhe, inscreva-se ou faça uma assinatura solidária do Opera Mundi, e tenha notícias, reportagens especiais e análises críticas sobre os principais acontecimentos do mundo.
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