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Protestos de bolsonaristas. Foto: EVARISTO SA/GETTY IMAGES/AFP. |
Uma
das cenas que mais me marcou no livro “Fogo e Fúria: por dentro da Casa Branca
de Trump”, de Michael Wolff, foi justamente o relato de uma manifestação
fracassada.
Era
o dia da posse do novo presidente, que esperava milhões de apoiadores em
Washington. Apareceram alguns milhares e os jornais noticiaram o fracasso em
tempo real. Trump se revoltou. Olhou pela janela da Casa Branca e, vendo os
tais milhares, insistiu sem qualquer hesitação:
como não tem 20 milhões de pessoas aqui? Os seus assessores, incrédulos diante
do que parecia um devaneio, concordaram com o presidente, atônitos. No dia
seguinte, Trump ordenou que as fotos da sua posse, em particular da multidão
reduzida, fossem espalhadas pela Casa Branca. Tentaram dissuadir o presidente,
que não recuou. O objetivo, segundo ele, era deixar claro que, no seu governo,
é a sua verdade que triunfará.
Acho
esse relato muito significativo. Trump blefou? Ninguém sabe e pouco importa. O
fato é que se trata de um estilo de “governo” que coloca a disputa pela
apreensão e definição da realidade, através da construção de fatos e versões,
em primeiro plano. A verdade, nesse caso, se define por uma pura relação de
força, que despreza o reconhecimento de uma uma realidade exterior que
independe da percepção subjetiva.
Não
se enganem. Bolsonaro não é Trump, mas não está muito longe dele. Podemos
discutir objetivamente se os protestos de hoje estavam mais para os milhares ou
para os milhões de apoiadores. Mas na chave na extrema direita, isso é a velha
política. Os atos foram grandes o suficiente para Bolsonaro fazer deles um
sucesso total. Vai construir o dia 26 como uma nova chancela popular e seguir
radicalizando o seu projeto político.
Em
outras palavras, não faz sentido disputar “a verdade sobre os protestos de 26
de maio” com o bolsonarismo. Nós reconhecemos a realidade, enquanto eles a
constróem. São, em certo sentido, menos ingênuos. Sabem que o verdadeiro poder
não é ver, é fazer ver. Loucura ou blefe? Tanto faz. O ponto é que não é a
linguagem da verdade que eles entendem. Se fosse assim, cultuariam livros e não
armas.
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