'Estamos diante de uma receita de impasse que não se resolverá com
jogadas pirotécnicas nem com golpes parlamentares.'
Por Helena Chagas
Se removermos um
pouco da espuma despejada no ambiente político nos últimos dias, não vamos
encontrar uma conspiração das elites arrependidas e do Congresso – que agora
parece se chamar Centrão – destinada a derrubar o presidente da República. Pelo
menos ainda não. Há, de fato, uma percepção clara do establishment econômico de
que pisou na jaca com os dois pés ao apoiar a eleição de Jair Bolsonaro só para
se ver livre do PT. Seus integrantes já perceberam o tamanho desse erro – e o
comportamento da Bolsa e do dólar nos últimos dias é apenas mais um sinal
disso.
Em suas
conversas, esse pessoal deixa claro que gostaria de se ver livre da insensatez
de Bolsonaro. Mas sabe que não é assim tão fácil. Não é preciso um profundo
exercício de futurologia para se prever os danos à economia e à imagem do país
que um novo e demorado processo de impeachment iria trazer a esta altura. Seria
desastroso, quando menos por inviabilizar, enquanto durasse o processo, a
aprovação das reformas que o mercado e o PIB tanto querem, a começar pela
Previdência. Golpe desse tipo, então, só depois da reforma.
A aposta numa
renúncia, outra opção aventada, é mais remota ainda. As semelhanças entre Jair
Bolsonaro e Janio Quadros podem ser muitas, sobretudo na psicologia de quem se
sente perseguido por “forças ocultas”, mas param por aí. Bolsonaro, com seus
filhos, é do tipo que se entrincheiraria no Alvorada para não ser derrubado.
Quem o conhece sabe que não renuncia.
Então, o que
resta às elites arrependidas? Apostar no tal parlamentarismo branco que vem
sendo acenado pelos grupos majoritários do próprio Congresso, dirigido hoje
pelo DEM e comandado pelo Centrão.
Só que isso
também é uma ilusão. O Congresso pode muito. Pode, no limite, derrubar o
presidente da República. Mas não pode governar no dia-a-dia porque não tem os
instrumentos institucionais do Executivo. Não assina medida provisória, não faz
decreto, não nomeia. Por mais que se tenham aprovado iniciativas como o
orçamento impositivo, e que haja planos de, por exemplo, limitar o poder do
Planalto de baixar medidas provisórias, quem governa é aquele que está lá no
terceiro andar do Planalto – que, por sinal, foi eleito para isso.
É por aí que,
depois de removermos toda a espuma acumulada nos últimos dias, vamos
desnudar um presidente acuado sobretudo pelas investigações que avançam sobre
seu filho e a relação com as milícias do Rio e um Congresso ávido por tomar as
rédeas do país em aliança com setores do establishment arrependido. Um pouco
mais adiante, veremos as ruas, que começam a se encher – por enquanto, com viés
de esquerda.
Estamos diante
de uma receita de impasse que não se resolverá com jogadas pirotécnicas nem com
golpes parlamentares. Talvez só com algum tipo de entendimento entre as forças
políticas, sociais e econômicas do país – mas aí elas teriam, à direita e à
esquerda, que ter o juízo que não demonstraram quando abriram o caminho para a
eleição do capitão reformado.
Fonte: Publicado em Os Divergentes
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