"Quando perdemos a capacidade de nos indignarmos com as atrocidades praticadas contra outros, perdemos também o direito de nos considerarmos seres humanos civilizados." ― Vladimir Herzog

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Painel Paulo Freire, obra de Luiz Carlos Cappellano.

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segunda-feira, 27 de maio de 2019

Um país em transe: as razões irracionais do fascismo. Por Jessé Souza

Quando analisei o processo de escrita da primeira edição do livro A elite do atraso, em maio de 2017, o Brasil já entrava de maneira decidida no ciclo pós-golpe de 2013-2016. o governo Michel Temer, a serviço precisamente da elite do atraso, passava a vender as riquezas nacionais e a precarizar as condições de trabalho da população com o ataque à CLT, a Consolidação das Leis do Trabalho. As consequências vieram rapidamente: empobrecimento geral da população, abandono dos serviços públicos e alto desemprego. Como denunciado no livro, a sociedade continuava sendo induzida pela grande imprensa a perceber todo o processo de saque das riquezas nacionais, da rapina do orçamento público e, consequentemente, da diminuição do poder de compra da população como produto apenas da “corrupção dos tolos” – a corrupção do estado e da política.

Vale lembrar, para o leitor mal-intencionado ou especialmente das intenções de votos de Lula. Terminado o pleito, Bolsonaro eleito, Sérgio Moro receberia como prêmio ao seu “trabalho” o cargo de superministro das atividades repressivas.

Ainda que o candidato com pregação fascista não tenha sido o preferencial da elite do atraso – o conjunto dos proprietários sob comando do rentismo internacional –, o fracasso dos seus candidatos “o ciais”, como Geraldo Alckmin, por exemplo, jogou toda a elite nos braços de Bolsonaro. Afinal, o fascismo sempre foi o “plano B” dos proprietários que só pensam no próprio bolso em todos os casos históricos relevantes. Mesmo que a alternativa fosse uma simples social-democracia leve e superficial como a incorporada pelo Partido dos Trabalhadores.

O que explicaria o fato de a maioria da nossa sociedade, sob o pretexto de evitar a chegada de um suposto ladrão à presidência, votar num candidato que faz a apologia do assassinato e da tortura de opositores? Quem, em sã consciência, poderia julgar como um argumento moralmente válido subordinar o suposto roubo ao assassinato? Como compreender que toda uma sociedade e suas crenças sejam postas de cabeça para baixo? Como explicar, enfim, o que parece inexplicável?

A verdadeira elite brasileira, que é a do dinheiro, que manda no mercado e que “compra” as outras elites que lhes são subalternas, criou o bode expiatório da corrupção só da política, como vimos anteriormente, para desviar a atenção de sua corrupção disfarçada de legalidade. Toda a sociedade tomou doses diárias desse veneno destilado pela mídia, pelas escolas e pela universidade e viu, imbecilizada, como não podia deixar de ser, uma meia dúzia de estrangeiros e seus capangas brasileiros tomarem seu petróleo, sua água, suas terras, seus recursos. Em nome da moralidade, do combate à corrupção e pelo suposto “bem do povo brasileiro”, roubaram tudo o que puderam e nos deixaram muito mais pobres.

Essa corrupção que se realiza agora de “verdade”, quantitativamente, sem nenhum exagero retórico, é literalmente milhares de vezes maior que toda a corrupção política da história brasileira somada. Por sua aparência de legalidade, não chamamos de corrupção quando bancos e corporações compram 400 deputados venais para assinar o que eles querem, não é mesmo? só um imbecilizado pensaria que o mero procedimento, aparentemente legal, é mais importante que o resultado concreto do saque. Imbecis: é isso que nos tornamos quando acreditamos no engodo do suposto e seletivo combate à corrupção da política como solução para as nossas mazelas.

Este livro foi escrito precisamente com o intuito de esclarecer a gênese deste processo histórico de dominação simbólica de toda a sociedade brasileira pela elite do saque e da rapina – legitimada e tornada invisível pelo embuste do combate à corrupção só do estado e da política. Nesse contexto, a massa da classe média e suas frações mais conservadoras, infelizmente, amplamente majoritárias, acabam por dar vazão ao ódio aos pobres ao mesmo tempo que são exploradas pelo saque rentista. Se a elite eterniza seu acesso aos cofres públicos como coisa sua, assalto que sua imprensa comprada comemora como vitória da “austeridade” contra o “populismo”, a classe média quer a garantia de que o povo continue como sempre foi: pobre, humilhado e obediente.

A classe média não quer só ganhar mais que os pobres. Ela também quer se deliciar com o prazer sádico e covarde que antes era apanágio do senhor de escravos: o gozo da humilhação contra quem não tem defesa e precisa aturar calado a piada, o abuso, o insulto, a humilhação sob todas as suas formas. Não é apenas a revolta – mesquinha, mas racional – contra o acesso dos pobres à universidade e por vê-los competir pelo bom emprego. É a raiva também de que o pobre possa usar o mesmo avião e comprar a mesma roupa no mesmo shopping center, ainda que a 24 prestações no cartão de crédito com juros abusivos. É a raiva por perder a empregada, aquela que é abusada de mil formas, e os trabalhadores sem qualificação, aqueles que não têm outra opção senão vender sua força de trabalho a qual- quer preço e sob qualquer condição. é desse modo que a escravidão e o ódio ao escravo, agora atualizado como ódio ao pobre, continua no âmago do nosso cotidiano.

Mas se a ampla maioria da classe média sempre foi implicitamente fascista no seu comportamento prático em relação aos pobres, como explicar o avanço do fascismo entre os próprios pobres? É preciso lembrar que esse é um fenômeno historicamente recente. o fascismo nasce, como no exemplo do italiano, a partir de uma dissidência do movimento operário socialista. É a oposição entre o internacionalismo clássico do movimento dos trabalhadores e o advento do nacionalismo operário que acaba por dividir a classe trabalhadora, fazendo surgir essa espécie brutalizada de reação dos dominados.

Todo fascismo é, portanto, reflexo de uma luta de classes truncada, percebida de modo distorcido e, por conta disso, violento e irracional no seu cerne. Na sua base está a manipulação de emoções que geram agressividade, como medo, raiva, ressentimento e ansiedade sem direção, sempre com fins de manipulação política. A incompreensão racional, por parte da população, de processos políticos complexos é utilizada para a construção de bodes expiatórios, um modo historicamente e ciente de canalizar frustração e ressentimentos sociais. A marginalização de grupos minoritários e a violência aberta e disseminada, contaminando a sociedade como um todo, são as consequências inevitáveis de todo fascismo.

Depois da tragédia do nazifascismo europeu, imaginou-se, durante um bom tempo, que o mundo estaria livre de ideologias que pregam abertamente o racismo e o ódio indiscriminado. No mundo atual, no entanto, seja em países desenvolvidos, seja em países periféricos, a ameaça de uma nova forma de política do ódio, muito semelhante em vários aspectos ao fascismo clássico, é um perigo cada vez mais iminente. Por isso, é crescentemente urgente compreendê-lo de forma adequada. Essa compreensão tem que sair dos meios acadêmicos restritos e ganhar a esfera pública. O pano de fundo é semelhante em todos os casos, mas a forma assumida é sempre particular em cada sociedade.

O contexto geral do neofascismo contemporâneo parece resultar do processo de desenraizamento político e social dos indivíduos provocado, na esfera política, pelas mudanças do capitalismo financeiro, hoje dominante. Por meio de uma política consciente que destruiu ou enfraqueceu sindicatos, partidos e a capacidade associativa em geral – muito especialmente das classes populares –, o capitalismo financeiro cria o isolamento individual como marca da sociedade contemporânea. Isolado, o indivíduo não apenas pode ser explorado, trabalhar mais ganhando menos, sem direitos trabalhistas. Acreditando-se “empresário de si mesmo”, ele é deixado politicamente sem defesa. Pior ainda, é também cada vez mais dominado pela propaganda neoliberal que diz que as vítimas do desemprego e do subemprego precário, produzidas por um sistema econômico concentrador e improdutivo, são, elas próprias, as culpadas pelo próprio infortúnio. Esse indivíduo isolado e indefeso é assolado por uma agressividade que não compreende e, desse modo, ele ou dirige contra si próprio a raiva que sente por sua própria pobreza e privação ou a canaliza contra bodes expiatórios construídos para este m. o caso brasileiro é paradigmático neste sentido. Uma multidão de desempregados e subempregados empobrecidos ao longo de anos de política em favor do rentismo nacional e internacional passa a ter a opção de dirigir sua raiva e seu ressentimento contra si mesma – quando não se entrega, como é comum, ao alcoolismo e à depressão – ou contra bodes expiatórios socialmente aceitáveis.

Os “belgas”, ou seja, a elite do atraso e a alta classe média “europeizada”, que se veem como estrangeiros na própria terra, oprimiram o “Congo”, ou seja, o próprio povo, e o reduziram à pobreza e à ignorância. Se transformou em ódio ao pobre o ódio ao escravo negro – eternizado nas classes populares de hoje, majoritariamente mestiças com escolaridade precária e condenadas ao trabalho desqualificado e semiqualificado. Essa é a base primeira de todo o ódio e o ressentimento reprimidos e recalcados que são o núcleo da sociedade brasileira contemporânea.

A ascensão do Partido dos Trabalhadores a partir dos anos 1980, com todas as suas limitações, foi uma inflexão importante no processo de organização popular. Com o golpe de 2013-2016, a reação conservadora veio primeiro de cima, da alta classe média nas ruas, da sistemática corrosão de valores democráticos diariamente perpetrada pela imprensa, da cooptação do STF e, por consequência, da destruição da ordem constitucional.

Foi dito a este povo que a corrupção política havia sido a causa do nosso empobrecimento. Entretanto, quando a corrupção dos partidos de elite fica óbvia a todos sem ser reprimida, todo o sistema perde representatividade. o golpe de misericórdia foi a prisão injusta do líder das classes populares desmobilizadas. Com base em um processo de aparência, o ex-presidente Lula foi impedido de participar das últimas eleições. Naquele momento, o último elo de expressão racional da revolta popular foi cortado.

Abriu-se a partir daí a porta para a revolta agora irracional das massas. A ascensão do líder com pregação abertamente fascista, Jair Bolsonaro, defensor da ditadura militar, do racismo, da tortura e do assassinato de opositores como arma política, só pode ser compreendida neste contexto. O próprio fato de, no governo do Partido dos Trabalhadores, dezenas de milhões de marginalizados terem a experiência do acesso à educação superior e ao consumo de massa, além da expansão de direitos para negros, mulheres e gays, causou violenta reação autoritária. Primeiro, de parte da elite e da alta classe média, evidenciada pelo desprezo e pelo ódio ao pobre que caracteriza qualquer sociedade marcada pela escravidão. Depois, pela ação de fake news em escala industrial no período eleitoral. As necessidades emocionais de um povo tornado pobre e ignorante por sua elite são impiedosamente estimuladas por 400 mil robôs em um tipo de guerra suja já utilizada para a eleição do presidente americano Donald Trump. Quando da onda de protestos das mulheres brasileiras sob a bandeira do #EleNão, em todas as grandes cidades do país, contra um candidato abertamente misógino que se diz defensor da subordinação das mulheres, as fake news foram utilizadas para construir mentiras que mudaram o panorama eleitoral a favor do candidato fascista também nas classes marginalizadas e pobres.

Os protestos sob as palavras de ordem “ele não”, majoritariamente compostos pelas mulheres da classe média mais crítica e engajada, possibilitaram a cooptação do voto feminino das classes populares, última cidadela contra a “ética da virilidade” do fascismo popular. Antes disso, o candidato fascista tinha rejeição ampla do voto feminino nessas classes. Aqui entra em cena o que há de mais sujo na política das fake news e da mentira institucionalizada. analistas de ultradireita da campanha fascista, que perceberam as consequências do isolamento político dos indivíduos que o capitalismo financeiro representa na esfera política, se aproveitaram impiedosamente desse fato para opor mulheres emancipadas da classe média contra as mulheres pobres e evangélicas, por meio da fusão de imagens reais da passeata com imagens de outros atos, como travestis quebrando santos, mulheres sem blusa, etc. Afinal, para quem é pobre e humilhada, o ganho emocional proporcionado pela distinção moral construída artificialmente em relação a mulheres supostamente “indecentes”, por meio de mentiras que não podem ser desmentidas, se torna irresistivelmente sedutor. É uma “vingança de classe” – obviamente distorcida e contra a fração errada da classe média – que acaba por funcionar como uma válvula de escape contra a pobreza e a humilhação vividas diariamente por essas mulheres.

Como já discuti em um livro anterior, a partir de pesquisas empíricas realizadas com os segmentos mais pobres da sociedade brasileira, a oposição “pobre honesto” versus “pobre delinquente” dificulta enormemente qualquer solidariedade de classe entre os mais pobres e marginalizados entre nós. o “delinquente” é percebido como o “bandido”, no caso do homem, e a “prostituta”, no caso da mulher. Todas as famílias das classes marginalizadas são esgarçadas por essa oposição cuja sombra se derrama sobre todos. A importância de líderes políticos que as representem a partir de cima e busquem diminuir a importância dessa contradição interna de classe com uma política pelos interesses de todos os pobres advém precisamente desse fato que comprovamos empiricamente em nosso estudo sobre os marginalizados brasileiros. É isso que o ex-presidente Lula representava. Sem isso, a porta fica aberta para a guerra de classe entre os próprios miseráveis, divididos entre os supostos honestos e supostos delinquentes.

É nesse contexto que a “ética da virilidade”, entendida como a ética dos que não têm ética, reina absoluta. O fascismo arregimenta a partir de cima os ressentimentos, medos e ansiedades sem explicação possível e os canaliza a bodes expiatórios. o sentimento antes disseminado pela grande imprensa contra o Partido dos Trabalhadores como covil da corrupção é apenas o mais óbvio. Mas todo fascismo usa e abusa da sexualidade reprimida das classes populares. A homossexualidade, que não pode ser admitida no sujeito, é canalizada em selvagem agressão externa; o ódio à mulher percebida como ameaça, e não como parceira, provoca uma agressiva regressão a padrões primitivos de relações de gênero. O pobre não é apenas pobre. Ele é humilhado e dominado por valores construídos para subjugá-lo. Isso confere ao fascismo enorme capilaridade e contamina a vida familiar e relações de vizinhança em todos os níveis da sociabilidade popular.

O que os pobres precisariam saber é por que eles ficaram mais pobres. Caso contrário, a raiva e a frustração em estado puro iriam, como foram, inevitavelmente, desaguar no primeiro bode expiatório socialmente legitimado. Primeiro o PT, criminalizado e estigmatizado como todas as organizações populares no Brasil. Mas também os gays, os negros, os índios, as mulheres, os nordestinos e todos que possam se tornar presas fáceis de uma agressividade sem direção. Os mecanismos opacos da dominação financeira, sejam os de mercado, como os juros escorchantes embutidos em tudo que compramos, sejam as formas estatais de apropriação do orçamento público como uma dívida pública fraudulenta e nunca auditada, precisam ser conhecidos e debatidos amplamente. Essa grande corrupção legalizada precisa ser tornada conhecida. Se isso não acontecer, o velho espantalho da corrupção política irá inevitavelmente ocupar o seu lugar. O erro da esquerda, que condicionou sua derrota eleitoral, foi precisamente este.

A espantosa falta de inteligência dos dois principais candidatos da “esquerda” nas últimas eleições foi, precisamente, não terem percebido o elo constitutivo entre o empobrecimento geral da população e sua transfiguração em limpeza moral a serviço do interesse geral. Simplesmente não foi revelado à população empobrecida e, portanto, legitima- mente raivosa e ressentida com seus representantes, o elo causal que teria permitido compreender a ligação entre o aumento do desemprego, da violência e da pobreza e o embuste da estratégia legitimadora elitista. Ambos defenderam a operação Lava Jato e apenas criticaram “abusos menores”. Isso em relação a uma operação de suposto combate à corrupção que literalmente blindou o sistema financeiro – a origem real da corrupção tanto ilegal quanto legalizada –, os órgãos da mídia venal e o poder judiciário como um todo. Além disso, se concentrou, seletivamente, na perseguição sem provas a líderes populares, como Lula, e no combate de fachada aos meros “operadores” de esquemas legais e ilegais de apropriação do estado pelos donos do mercado.

Desde o fim da República Velha, o moralismo postiço do suposto combate à corrupção, elevado ao status de interpretação dominante do país, e a criminalização seletiva da política, do estado e da soberania popular servem à eternização desse modelo e seus dois fundamentos principais: tornar o orçamento do estado um banco particular da elite; criminalizar sob todas as formas a soberania popular. Este bode expiatório da corrupção apenas da política, que detém seu quinhão de verdade – ou não enganaria ninguém – serve para tornar literalmente invisível a corrupção legalizada do mercado.

Um exemplo concreto ajuda a tornar compreensível o embuste. Ninguém em sã consciência deixaria de achar condenável a rapina pessoal do ex-governador Sérgio Cabral e seus 280 milhões de reais desviados e descobertos pela operação Lava Jato. No entanto, a população do estado do Rio de Janeiro ficou mais pobre não por conta desses desvios. é um ato recriminável, sem sombra de dúvida, e merece punição exemplar. Mas o que empobreceu de fato o estado do Rio de Janeiro foi a propaganda da imprensa venal associada à Lava Jato na campanha de criminalização da Petrobras, empresa de cujos royalties o estado inteiro dependia. Não apenas o Rio de Janeiro precisava deles para obras de infraestrutura geradoras de em- prego e pagamento de serviços públicos, como o país como um todo dependia da capacidade de investimento da Petrobras, que chegou a representar mais de 50% do investimento público nacional.

A perda aqui é na escala de centenas de bilhões de reais todos os anos, montante suficiente para empobrecer e desempregar, efetivamente, populações inteiras. a superfície aparentemente legal desse expediente permite tornar invisível a histórica expropriação elitista das riquezas nacionais e ainda culpar convenientemente um bode expiatório. Legitimada, a patranha elitista pode ser eternizada séculos a o sem reação e sem denúncia. Estigmatizada e criminalizada enquanto empresa, a Petrobras está prestes a ser vendida a preço de banana, tal como acontece em todo saque privado às riquezas públicas desde que o Brasil é Brasil.

Ao entrevistar recentemente, para meu último livro, A classe média no espelho, ex-engenheiros da Petrobras que perderam o antigo emprego e se transformaram em motoristas de Uber, todos me disseram que a culpa de sua desgraça pessoal seria da “política” e do “Cabral”. Foi o que aconteceu com a população brasileira como um todo. a invisibilidade desse processo é obviamente ainda maior nas parcelas mais pobres da população.

Quando a esquerda não denuncia este esquema elitista e, ao contrário, o legitima e valida expressamente, no elogio a Moro e à Lava Jato, me pergunto como pretende não só ganhar eleições, mas também esclarecer a sua população sobre as causas reais de sua desventura e exploração? Neste contexto, imaginar que a oposição abstrata entre democracia e fascismo – quando a maioria do povo já vive um “fascismo prático” de violência e exclusão – pode criar comoção e simpatia para sua causa, sem explicar as causas da pobreza real, é de uma ingenuidade atroz.

*posfácio do livro A elite do atraso

“Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica
e corrupta formará um público tão vil como ela própria.” Joseph Pulitzer

*Jessé Souza é graduado em direito e mestre em sociologia pela Universidade de Brasília, a UnB, doutor em sociologia pela Universidade de Heidelberg, na Alemanha, e fez pós-doutorado em psicanálise e filosofia na New School for Social Research, em Nova York. É autor de mais de 20 livros e de artigos e ensaios em vários idiomas. Entre seus maiores sucessos, se destacam A tolice da inteligência brasileira, A radiogra a do golpe, Subcidadania brasileira e A elite do atraso (LeYa); A ralé brasileira (Contracorrente); e Os batalhadores brasileiros (Editora UFMG). Atualmente é professor titular de sociologia da Universidade Federal do ABC.




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