"Quando perdemos a capacidade de nos indignarmos com as atrocidades praticadas contra outros, perdemos também o direito de nos considerarmos seres humanos civilizados." ― Vladimir Herzog

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Painel Paulo Freire, obra de Luiz Carlos Cappellano.

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quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Defesa da tortura torna Bolsonaro incompatível com a presidência. Por Paulo Moreira Leite

"Bolsonaro definiu um padrão inaceitável de comportamento político", escreve Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia. "Ao ouvir uma crítica, se refugia num universo mental mobiliado pela cadeira do dragão, pau de arara e outros instrumentos de tortura capazes de produzir o sofrimento mais atroz que a mente humana foi capaz de produzir."

(Foto: Clauber Cleber Caetano/PR)
Diante dos vergonhosos elogios de Jair Bolsonaro à Augusto Pinochet, cabe reconhecer de uma vez por todas que o Brasil possui um presidente incompatível com as responsabilidades do cargo que recebeu nas urnas de outubro de 2018 e tem direito legal de ocupar até janeiro de 2023. 

Não se trata de reprovar declarações grosseiras e denunciar bobagens diárias, ou mesmo questões muito graves, como o projeto 03 em Washington, a reforma da Previdência, os incêndios da Amazônia. A questão é mais essencial e decisiva, de outra qualidade. 

Diz respeito aos fundamentos de nossa democracia, tal e qual ela foi pensada e construída em 1988, como referência para  futuras gerações de brasileiros e brasileiras.

Ao saudar a "coragem" dos homens que torturaram e assassinaram o brigadeiro Alberto Bachelet, pai de Michelle Bachelet, presidente do Chile entre 2006 e 2010, uma segunda vez entre 2014 e 2018, ela própria vítima de tortura, Bolsonaro fez um auto retrato definitivo e traçou  um caminho sem volta. 

Num comportamento que já vai se tornando um costume, sempre que ouve uma crítica, ou sente-se desafiado, o presidente se refugia atrás de universo mental mobiliado pela cadeira de dragão, o pau de arara e outros instrumentos capazes de produzir o sofrimento mais atroz que a mente humana foi capaz de produzir. 

Alta Comissária de Direitos Humanos da ONU, Michelle Bachelet tornou-se alvo porque, de volta a Genebra ao fim de uma viagem ao Brasil, atreveu-se a contar aquilo que todo mundo está vendo: "observamos uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos". 

O mais grave é que, em apenas oito meses de mandato presidencial, não foi o primeiro episódio de Bolsonaro. No final de julho, quando o presidente da OAB Felipe Santa Cruz denunciou a dor de décadas uma família que perdeu o pai, desaparecido no porão da tortura, Bolsonaro também reagiu com palavras grosseiras e ofensivas -- num sinal de que não estava incomocadao com o crime contra Fernando Santa Cruz, mas pelo protesto inconformado de quem denunciou os fatos. 

Em 2016, ao dar seu voto a favor do impeachment, Bolsonaro usou a memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra ( "o pavor de Dilma Rousseff") para uma mórbida celebração da tortura a presos políticos. 

A gravidade institucional desse comportamento, sua incompatibilidade com as leis do país, não precisa ser sublinhada. Ao tomar posse, em janeiro, Bolsonaro comprometeu-se a "manter, defender e cumprir a Constituição". Acontece que a carta de 1988 afirma, no inciso III do artigo 5 que "ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante". 

Também acrescenta, no mesmo artigo, um pouco mais adiante, que "a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e 05 crimes definidos como hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem". 

É cada vez mais difícil negar que faltam a Bolsonaro a "dignidade, a honra e o decoro" exigidos pelo cargo, atributos que, segundo a lei 1079, de 1950, definem os "crimes de responsabilidade" de presidentes e ministros de Estado. 

Seu enquadramento nesses crimes já não é uma questão jurídica, mas política. 

Como Pinochet no passado, protegido até o último de seus dias pelos figurões imperiais que sustentaram uma ditadura especialmente cruel em troca do desmonte do sistema de bem-estar social construído no chile,  Bolsonaro conta com apoio sem escrúpulos dos mercados internacionais. Admirador confesso da política econômica de Pinochet, o Chicago Boy Paulo Guedes tornou-se peça chave na montagem do governo em função disso. 

Num país às voltas com um desemprego trágico, uma economia paralisada e um desalento geral, só se engana quem finge não enxergar os perigos que Bolsonaro representa para o Brasil.  

Alguma dúvida? 



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